Publicação brasileira técnico-científica on-line independente, no ar desde sexta-feira 13 de Agosto de 2010.
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Periodicidade: Semestral (edições em julho e dezembro) a partir do inicio do ano de 2013.
Mensal entre 13 de agosto de 2010 e 31 de dezembro de 2012.

terça-feira, 5 de abril de 2011

A história de Lagoinha: breve estudo sobre a origem da cidade.

Para entender a história... ISSN 2179-4111. Ano 2, Volume abr., Série 05/04, 2011, p.01-07.


A cidade de Lagoinha, na região do Vale do Paraíba, no Estado de São Paulo, possui uma rica história econômica e social, pouco conhecida e estudada.
Entretanto, pensando em termos gerais, existe uma intima ligação entre a localização da cidade e o ciclo do ouro e inicio do ciclo do café.
É interessante ressaltar que os motivos da decadência econômica da cidade estão ligados também a localização geográfica, distante do eixo regional, desvinculada da construção da Estrada de Ferro no século XIX e da rodovia Dutra no século XX.
A partir de um olhar voltado para o início da formação brasileira, estudar a história de Lagoinha é buscar compreender a história do Brasil.
O conhecimento sobre a cidade, do ponto de vista historiográfico, é até então obscuro, principalmente se tratando de dados anteriores a segunda metade do século XIX.
O que reforça sua ligação com a origem tropeira e abre um precedente na história da origem de algumas cidades da região Vale-paraibana.
Porém existe material para pesquisa, tal como o que foi utilizado por nós para tentar contar um pouco da rica história de Lagoinha.
Estamos nos referindo a fontes primárias, como o livro Tombo da Paróquia de Lagoinha, escrito pelo vigário local, padre João Paulo Roberto, no inicio do século XX.
Além é claro de autores que ajudam na compreensão do contexto, fornecendo base teórica, como: Goulart, Maia, Holanda, Sanches, entre outros.


A origem do nome da cidade. 
Continuando um projeto iniciado no final dos anos 1990, iniciamos no ano 2000 um compêndio que tratava de alguns aspectos que poderiam ser utilizados como base para avaliar o grau de desenvolvimento da cidade de Lagoinha.
A idéia era ajudar a população a descobrir mais sobre a origem da cidade e algumas das razões que levaram Lagoinha a se localizar geograficamente onde está.
Buscando desvendar esta última questão, acabamos notando que o troperismo estava na gênese da criação da cidade.
O povoado que originou o núcleo populacional foi utilizado como ponto de apoio aos tropeiros e viajantes de alguns ciclos econômicos, pelo qual a economia brasileira passou.
Em um estudo toponímico, era uma prática lógica que todo pouso de tropa se localizasse nas margens de uma lagoa.
Daí o nome: Lagoinha.


O tropeirismo.
O muar vai ter uma importância considerável no desenvolvimento econômico e social da província de São Paulo, Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso.
Podemos reafirmar que Lagoinha, assim como tantas outras cidades da região, tiveram sua origem ligada ao tropeirismo e, conseqüentemente, a alguns ciclos econômicos que alimentaram sua prática na região Vale-paraibana.
As paragens onde Lagoinha está localizada já eram utilizadas, como ponto de apoio pelos tropeiros que subiam a Serra do Mar, pelo sul fluminense, precisamente pela cidade de Parati, atingindo a freguesia do Facão (atual cidade de Cunha).
Daí enveredando para Lagoinha, São Luiz do Paraitinga e Taubaté, rumando para Pindamonhangaba, Guaratinguetá, Lorena, Embaú, para atingir as Minas Gerais.
Não nos esqueçamos de que o tropeiro seguia uma lei rígida e invariável que consistia em seguir pelo caminho que oferecesse menor esforço.
Consideramos de capital importância o depoimento do pároco de Lagoinha, o padre João Paulo Roberto, o qual ajuda na compreensão mais acertada da origem de Lagoinha.
 Através deste depoimento, podemos ter uma idéia mais acertada sobre as razões da criação e decadência de cidades que tiveram sua origem ligada ao tropeirismo.
Segundo o pároco:

“Sendo criado este município em tempos que o mantimento comercial se fazia por meio das tropas tendo como centros de importação e exportação as cidades de Ubatuba e Paraty o lugar tendia a algum crescimento, porém, levado a término a estrada de ferro central, ficou como que desmembrada toda essa zona em completo abandono ficam vegetando decadentes cidades outrora tão florescentes, como Ubatuba, Cunha, São Luiz e até Paraybuna” (Tombo da Paróquia de Lagoinha. 1904, p.08).


Ciclo do Ouro.
No final do século XVII, quando surgiram as primeiras notícias da descoberta de grandes veios auríferos na América Portuguesa, começaram, gradualmente, a surgir cidades pelos caminhos que envolviam a logística em volta da mineração.
Nas primeiras décadas do século XVIII, inúmeras vilas e cidades foram fundadas no interior da colônia, em torno dos centros de exploração de metais e, mais tarde, de pedras preciosas (ouro e, principalmente diamantes).
Ouro fácil, de rápida extração, mas que, por isso mesmo, esgotava rápido.
Entre a descoberta, o apogeu e a diminuição da produção, não se passaram mais do que vinte anos.
A extração atingiu seu apogeu em 1760.
Vinte anos depois, o montante retirado das jazidas havia se reduzido à metade.
Estima-se que em vinte anos chegaram à área mineradora cerca de 180 mil pessoas vindas de várias partes da colônia e do reino.
Nos primeiros anos da mineração, operou-se violenta alta de preços dos produtos comercializados nas regiões auríferas, dada a escassez de mercadorias, inclusive alimentos.
A carestia na região mineradora gerou reflexos até no litoral, registrando escassez por causa dos produtos levados para as minas.
A corrida de paulistas e cariocas em direção a Minas Gerais, por causa da descoberta do ouro, provocou a escassez de alimentos e a necessidade de um meio de transporte que facilitasse a ligação aos portos.
Foi quando o Vale do Paraíba se tornou o celeiro das Minas Gerais, com a introdução da pecuária e de intensa produção agrícola destinada ao mercado interno.
A reboque, tornou-se também um ponto de encontro das tropas que levavam metais e pedras preciosas para o litoral, onde seriam embarcadas para Portugal, transportando as mercadorias necessárias ao abastecimento dos mineradores.
Lagoinha teve um papel significativo para os viajantes que seguiam rumo às cidades portuárias de Parati e Ubatuba.
Uma vez que, quase sempre, prevalecia a lei rígida no ambiente tropeiro: o menor esforço.
Portanto, o que explica a vocação pecuária e agrícola da localidade prevalecente até hoje.


O Ciclo do Café.
O rio Paraíba do Sul nasce ao pé da serra da Bocaina, no Estado de São Paulo, desaguando em Campos, no Estado do Rio de Janeiro.
Esse rio atravessa um imenso Vale, que recebe exatamente o nome de Vale do Paraíba.
O Café impulsionou o Vale do Paraíba e regiões no seu entorno no século XIX.
A região foi utilizada como núcleo de apoio aos viajantes do ciclo.
Os tropeiros que comerciavam através do porto de Ubatuba oriundos do sul de Minas Gerais e fundo do Vale do Paraíba, por vezes, faziam o trajeto que partia de Roseira (médio Vale do Paraíba), Lagoinha, Catuçaba (distrito de São Luiz do Paraitinga) e, por fim, Ubatuba.
Mas, embora seja uma história recente, reconstruir esta época, no âmbito do entendimento da formação de Lagoinha, está ainda por ser feito.


Concluindo.
No ciclo do ouro, inúmeras vilas e povoados foram fundados na beira de trilhas de muito trânsito de pessoas e mercadorias.
O sítio onde Lagoinha se encontra foi utilizado como núcleo de apoio aos tropeiros do médio Vale do Paraíba, que tinham como destino o porto da cidade de Parati e, posteriormente, os tropeiros oriundos do Sul de Minas Gerais e fundo do Vale do Paraíba que mantinham relações comerciais através do porto de Ubatuba.
A marcha tropeira alcançava no máximo 40 km de jornada e o repetir dos pousos veio a ser o embrião de futuras vilas, freguesias e cidades.
As distâncias que separam Lagoinha de Roseira (médio Vale do Paraíba), Cunha e Catuçaba ( distrito de São Luiz do Paraitinga), ambas na Serra do Mar, estão dentro da jornada percorrida pela tropa na região.
Uma vez que, o percurso vencido a cada dia variava de acordo com a procedência de cada tropa.
A distância que separa Lagoinha, das suas cidades vizinhas, gira em torno de uma marcha, (equivalendo a cinco léguas), se a légua equivale a seis quilômetros, então, as cidades são separadas por algo em torno de trinta quilômetros.
O depoimento do padre João Paulo Roberto, sobre a origem de Lagoinha, coletado a partir da oralidade, registrado em 1904, embasa esta hipótese:

“Sendo criado este município em tempos que o mantimento comercial se fazia por meio das tropas” (Tombo da Paróquia de Lagoinha. 1904, p.08).

Novamente a origem tropeira da cidade é exaltada, tendo já sido atestada pelas estórias que se contam entre os moradores mais antigos.
Raiz de sua gênese e também causa do se baixo desenvolvimento quando por ocasião da introdução da Estrada de Ferro em Taubaté.
As ferrovias são apresentadas como o “principal indutor de progresso”.
Esta afirmativa é merecedora de ressalvas, posto que cidades como Lagoinha ficaram fora do eixo ferroviário, tendo sua constituição motivada pelo transporte muar, viram sua tendência a “algum desenvolvimento” frustrada.
As Estradas de Ferro que representaram possibilidades de crescimento demográfico para varias cidades do Estado de São Paulo, nas palavras do Padre João Paulo Roberto fizeram cidades como Lagoinha permanecerem em estado “vegetativo”.
O grande escritor, taubateano, Monteiro Lobato, que comparou Oblividon com inúmeras cidades Vale-paraibanas, Lagoinha não podia ficar fora de tão caricata descrição:

“A cidadezinha onde moro lembra soldado que fraqueasse na marcha e, não podendo acompanhar o batalhão, à beira do caminho se deixasse ficar, exausto e só, com os olhos saudosos pousado na nuvem de poeira erguida além” (LOBATO, 2004, p.25).

Monteiro Lobato diz que a razão da decadência dessas cidades foi um desvio da civilização.
O telégrafo não pode por estas cidades a falar com o resto do mundo, até a estrada de ferro se esqueceu de uni-las pelo intermédio de um humilde ramalzinho.
Foi assim que Lagoinha não pode continuar a crescer.


Fontes.
DIVERSOS. Tombo da Paróquia de Lagoinha. Registros paroquiais de 03 de Novembro de 1904 a 26 de Maio de 1999.
SILVA, Altair Viana da. Conhecer-Compreender-Construir. Compilação de dados sobre o município e Lagoinha, Edição mimeografada, 2000. 


Para saber mais sobre o assunto.
GOULART, José Alípio. Tropas e Tropeiros na Formação do Brasil. Rio de Janeiro: Conquista, 1961. 
LOBATO, Monteiro. Cidades Mortas. São Paulo: 2004.
MAIA, Tom & HOLANDA, Sergio Buarque de. Velhas Fazendas. São Paulo: 1995.
MARTINS, Ana Luiza. O Trabalho nas Fazendas de Café. São Paulo: Atual, 1994.
RIBEIRO, Darcy. A Formação e o Sentido do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. 
RUFFATO, Luiz. Memória do Comércio no Vale do Paraíba. São Paulo: Museu da Pessoa/SESC SP, 2004.
SANCHES, Fabio de Oliveira. Estrada Real: o caminho do Ouro. São Paulo: 2006.
SANTIAGO, Pedro. Por Dentro da História. São Paulo: Escala Educacional, 2005.
SETTI, João Bosco. Ferrovias do Brasil: um século de Evolução. São Paulo: Memória do Trem. 2008.
WEHLING, Arno. Formação do Brasil Colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.


Texto: Prof. Altair Viana da Silva.
Licenciado em História, com especialização na mesma área pela Universidade de Taubaté.
Professor da rede estadual de ensino de São Paulo, atuando na escola Padre Chico de Lagoinha.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Marx e o materialismo histórico.

Para entender a história... ISSN 2179-4111. Ano 2, Volume abr., Série 04/04, 2011, p.01-08.


Enquanto o positivismo representou uma preocupação com a manutenção da ordem capitalista, o marxismo procurou realizar uma critica a este tipo de sociedade, colocando em evidência as contradições.
O representante maior desta critica foi Karl Marx (1818-1883), auxiliado por Friedrich Engels (1820-1903).
Ambos demonstraram grande preocupação em provar que o capitalismo seria um acontecimento transitório, diante do aparecimento iminente de uma classe revolucionaria no seio da sociedade capitalista.


As idéias de Marx.
Alemão, quando era jovem, Marx testemunhou o crescimento das fábricas e da desigualdade, foi quando se envolveu em conflitos políticos com o governo de seu país.
O que, depois de breve período de estudo na França, fez com que se estabelecesse na Inglaterra como exilado político.

Neste ultimo país pode observar de perto o nascente desenvolvimento industrial do capitalismo no século XIX.


Isto fez com que Marx passasse a enxergar o capitalismo como um sistema de produção presente em sistemas econômicos anteriores, chegando a afirmar que as mudanças sociais estariam ligadas ao desenvolvimento da economia.
Neste sentido, os detentores de capital, chamados de capitalistas, proprietários dos meios de produção, formariam a classe dominante, utilizando a ideologia para manipular os proletários.
O termo proletário é usado por Marx para designar os despossuídos que só tem como capital sua mão de obra, vendida aos capitalistas em troca de um salário.
Na realidade, a palavra não era nova, sua origem remonta a Roma antiga, significando, a partir do latim, aquele que só tem como propriedade a sua prole, já que os filhos e a esposa podiam servir de garantia para contrair empréstimos.
No contexto romano, ao não saldar um divida, o proletário tinha a prole escravizada e, em casos extremos, o próprio devedor se tornava escravo.
Em todo caso, no século XIX, para Marx, a ideologia, utilizada pelos capitalistas para controlar as massas, poderia ser definida como idéias que influenciam comportamentos.
Estas idéias estariam presentes nas instituições, montadas de forma a ocultar as relações antagônicas entre capitalistas e proletários, sempre favorecendo as elites.
Em escolas, por exemplo, a ideologia das classes dominantes estaria fortemente presente, não só através do próprio sistema educacional, como também, inclusive, nos textos dos livros didáticos.
Assim, para romper com este domínio, o conhecimento dos papéis assumidos pelo conjunto das instituições seria fundamental.
Compreender a sociedade capitalista, incluindo o estudo do sistema educacional, seria essencial para construir uma sociedade mais justa.
Pensando na questão, em sua principal obra, O capital, Marx desenvolveu a idéia de que existe uma relação de exploração entre classes, resultando em conflitos despertados pela divisão injusta da “mais valia”.
A “mais valia” seria a diferença entre o custo de contratação de mão de obra e recursos necessários para produção, contraposto ao rendimento do resultado final.
Em outras palavras, simplificando, a “mais valia” representa o valor agregado ou o lucro, o que ele chamou de valor excedente ou maior, concentrado inteiramente nas mãos do capitalista, de onde veio justamente o dito termo.
Daí a famosa expressão: “a culpa é da mais valia”.
Um slogan muito utilizado por marxistas até hoje para se referir as desigualdades sociais registradas dentro do âmbito do sistema capitalista.
Entretanto, as idéias de Marx não são originais, remetem a vários outros pensadores, pegando conceitos emprestados.


Os pensadores que influenciaram Marx.
Filho de um jurista prussiano e mãe holandesa, de família judaica forçada à conversão ao luteranismo, Marx estudou direito na Universidade de Berlim, onde Georg Wilhelm Friedrich Hegel foi professor e reitor.
As concepções filosóficas de Hegel influenciaram fortemente o pensamento marxista, fazendo com que adquirisse o conceito de historicidade.
Para Hegel o mundo está em constante mudança, sendo condicionado por dois fatores que alteram o comportamento humano: coerção e liberdade.
O homem só conseguiria adquirir sua liberdade plena quando percebe que é um agente da história, que construi seu próprio destino, o que aconteceria por meio de uma revolução, sendo mergulhada em violência e coerção.
Como exemplo, ele cita a Revolução Francesa, um momento de libertação humana que foi conseguido através do terror, onde os opositores da cidadania foram exterminados pelos grupos que conseguiram enxergar seu papel na história.
Portanto, os movimentos históricos que geram rupturas acontecem de forma dialética.
Um outro conceito do qual Marx se apropriou, adotado como ferramenta junto com o materialismo histórico.
Este último também não foi desenvolvido por Marx, mas sim por Ludwig Feuerbach, embora não fosse assim nomeado pelo pensador.


Feuerbach se opunha as teorias de Hegel, discordando dele no que diz respeito a historicidade ser manipulada pelo espirito humano, pelas idéias; ao inverso, achava que as questões materiais é que determinam o pensamento.

Portanto, Feuerbach era um filosofo materialista que considerava a existência material como determinante dos comportamentos sociais.
Neste sentido, achava que a materialidade condicionava as idéias, usadas para manipular as pessoas, alienando, reduzindo a capacidade dos individuos de agirem por si só, tornando-os marionetes nas mãos dos grupos que compartilham o poder.
Afirmava que a religião consistia em uma projeção dos desejos humanos, não era concreta, sendo uma forma de alienação.
Conceitos que Marx uniu com o socialismo utópico francês, uma corrente que afirmava que o desenvolvimento de preceitos morais e ideológicos conduziriam a humanidade à formação de uma sociedade mais justa, com a partilha fraterna dos bens materiais.
A idéia estava baseada no pressuposto de que a moral cristã burguesa exigia o bem estar do próximo, o que levaria as civilizações naturalmente até o socialismo.
Marx considerou ingênuos os socialistas utópicos franceses, pois, tal como Hegel, pensava que seria necessário uma revolução para implantar o socialismo, mas na realidade acabou absorvendo várias de suas concepções.
Nesta grande salada, onde o marximo uniu dois filosofos opostos como Hegel e Feuerbach com idéias dos socialistas utópicos franceses, foram somados ainda componentes desenvolvidos por economistas ingleses, como Adam Smith e David Ricardo.
Conceitos muito discutidos entre os intelectuais da época, nas rodas de conversa freqüentadas por Marx, passaram a compor o centro do marxismo.
Dentre os quais a idéia de divisão social do trabalho, presente entre positivistas e funcionalistas, além da acumulação primitiva de capital, explicação segundo a qual a capitalização não é possivel pura e simplesmente pela divisão racional do trabalho.
O enriquecimento só aconteceria através da expropriação da produção coletiva.
Um exemplo concreto é o inicio dos cercamentos que deram origem a propriedade privada nos primórdios do aparecimento das primeiras civilizações.
No inicio da humanidade, as terras não tinham dono, tudo pertencia a coletividade, ao clã, familia ou grupo; porém, diante da ganância e da carência de recursos, os mais forte teriam começado a se apropriar do que era coletivo, cercando as terras para delas tomar posse.
Em outras palavras, toda acumulação primitiva de capital só é possivel através da criação de desigualdades que tendem a se tornar cada vez maiores.


O marxismo.
O que se convencionou chamar de marxismo é apenas uma colagem de vários conceitos vigentes na época de Marx, contudo, a originalidade reside justamente na junção de idéias antagônicas sobre o tripé dialética, materialismo histórico e socialismo cientifico.
Para Marx, o pensamento dialético conduziria a sociedade a revolução e, esta, ao socialismo.
Enquanto instrumental, a dialética, também chamada de materialismo dialético, pode ser caracterizada como um método que consiste em efetivar uma espécie de diálogo consigo mesmo, compondo um raciocinio que, explorando as contradições, envolve tese, antítese e síntese.
Além da dialética, outro componente essencial que conduziria a revolução seria o materialismo histórico, uma tendência que parte da base econômica para explicar outros níveis de realidade, como religião arte ou política.
Para o materialismo histórico, os fatores econômicos, as condições materiais, explicam todos os fenômenos históricos e sociais, inclusive os conflitos de classes, tidos como origem de diversos problemas sociais.
No caso de uma sociedade, por exemplo, restrita em suas fronteiras por povos mais fortes e pelo mar, com território pouco vocacionado a agricultura, a luz do materialismo histórico, teríamos o desenvolvimento de uma civilização de pescadores e, posteriormente, de navegantes e comerciantes.
Juntando estes dois elementos, dialética e materialismo histórico, Marx pensou no socialismo cientifico, uma tendência política, econômica e social definida como estágio superior de desenvolvimento civilizacional.
Segundo Marx e Engels, o capitalismo seria apenas uma etapa rumo ao socialismo, uma vez que as contradições entre burguesia e proletariado iriam amadurecer dentro deste sistema.

As contradições e condições materiais conduziriam a humanidade a um novo sistema econômico, compondo uma sociedade igualitária, com a abolição da propriedade privada e das classes sociais.

Exatamente por esta razão, os opositores do socialismo cientifico, também o chamam de utópico, tale como eram nomeados os defensores da tendência francesa do século XIX.

O socialismo cientifico seria utópico porque uma sociedade totalmente igualitária é inviável, devido a uma série de fatores, inclusive a própria natureza humana.
O termo utópico faz uma referência a obra de Thomás More, Utópia, uma ficção que narra a vida em uma sociedade perfeita, localizada em uma ilha, fazendo com que a palavra se tornasse sinônimo de perfeição impossivel de ser colocada em prática.


Concluindo.
O socialismo cientifico ou utópico, originado a partir do pensamento marxista, desdobrou-se em inumeras tendências, tal como o leninismo, o stalinismo, o trotsknismo, o castrismo, etc.
Em geral, onde o socialismo real foi implantado, um regime igualitário nunca foi concretizado, o governo compartilhado se degenerou em ditaduras repressivas e sangrentas.
O próprio Marx se equivocou ao considerar que o primeiro país onde o socialismo surgiria espontaneamente, com as contradições conduzindo a um revolução do proletariado, seria a Inglaterra.
Isto porque, como representante maior do sistema capitalista, com uma classe proletária, crescente por conta da industrialização, seria entre os ingleses que as contradições se tornariam gritantes a ponto de provocar uma revolução.
Ao inverso, a revolução começou na Rússia, país eminentemente agrário, liderada não por proletários, mas por intelectuais de classe média que pensavam estar lutando por todos, quando na verdade apenas substituiram os monarquistas na liderança da nação.
Entretanto, foram condições materiais que conduziram a Rússia a revolução bolchevic, tal como o contexto da primeira guerra mundial.
Portanto, o materialismo histórico mostrou sua utilidade, é pena que o próprio Marx não tenha conseguido utilizá-lo adequadamente como instrumental.


Para saber mais sobre o assunto.
BORGES, Vavy Pacheco. O que é história. São Paulo: Brasiliense, 1987.
ENGELS, Friedrich. A origem da familia e da propriedade privada. São Paulo: Bertrand, 2006.
GIDDENS, Anthony. Capitalismo e moderna teoria social. Lisboa: Editora Presença, 1994.
GIDDENS, Anthony. Sociologia. Porto Alegre: Artmed, 2005.
MAGEE, Bryan. História da filosofia. São Paulo: Loyola, 2000.
MARTINS, Carlos B. O que é sociologia. São Paulo: Brasiliense, 1985.
MARX, Karl. O Capital. São Paulo: Saraiva, 2010.
MARX, Karl & ENGELS, Friedrich. A ideologia alemã. São Paulo: Grijalbo, 1977.
MORE, Thomás. Utópia. São Paulo: Martins Fontes, 2009.

Texto: Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos.
Doutor em História Social pela FFLCH/USP.

sábado, 2 de abril de 2011

Fundamentos econômicos da educação: considerações sobre a economia na educação.

Para entender a história... ISSN 2179-4111. Ano 2, Volume abr., Série 02/04, 2011, p.01-10.


Embora pareça não existir relação entre economia e educação à primeira vista, existe uma vinculação estrita entre as duas esferas.
Desde a formação das primeiras sociedades primitivas, a educação sempre esteve subordinada a economia.
Nos primeiros aglomerados humanos, os indivíduos eram treinados conforme as necessidades do grupo, na pesca ou na caça, por exemplo.
Enquanto sociedades, com natureza econômica mais desenvolvida, direcionavam o sistema educacional para suprir estas necessidades.
Uma dinâmica que persiste até hoje, embora constituindo uma relação entre economia e educação mais complexa.


Economia e educação ao longo da história.
Economia e educação sempre estiveram intimamente relacionadas desde os primórdios da história da humanidade e do surgimento das primeiras civilizações.
Entre os gregos, na antiguidade, enquanto Atenas, cidade ligada ao comércio, construiu um sistema educacional voltado ao desenvolvimento intelectual de novos conhecimentos, fazendo inclusive nascer à filosofia.
Em Esparta, cuja principal atividade econômica era o saque de bens acumulados por outros povos, o sistema educacional foi pensado para formar guerreiros.
Do mesmo modo, contemporaneamente, um país predominantemente agrícola ou industrial centraliza sua educação para suprir o setor com a mão de obra adequada.
Uma das poucas tentativas de construir uma educação desvinculada da economia aconteceu durante o Renascimento, entre o século XII e XV.
Foi quando os humanistas propuseram um sistema educacional mais amplo, que possibilitasse uma formação generalista, sem a preocupação com as funções necessárias para suprir a economia.
Os humanistas pensaram uma educação que formasse pessoas em busca de um aprimoramento das capacidades humanas e não necessariamente técnicas ou teóricas.
É importante ressaltar que, até então, embora a grande maioria da população só tinha acesso a uma educação informal.
A educação formal era destinada a uma minoria, somente voltada a constituir a mão de obra necessária ao bom funcionamento da sociedade, fornecendo possibilidades quase nulas de mobilidade social.
Somente com a Revolução Francesa - com seu ideal de igualdade, liberdade e fraternidade -, é que a educação formal começou a ser popularizada, massificada em certo sentido.
A partir deste momento, gradualmente, a educação passou a ser fornecida pelo Estado, de forma publica e gratuita, até porque o conceito de Estado estava ainda em formação.
No entanto, com a Revolução Industrial, a partir do século XVIII, a necessidade de suprir com mão de obra especializada o sistema capitalista, massificou a educação, adequando-a, mais do que nunca, as exigências econômicas.
Na realidade, a afirmação de que o sistema capitalista nasceu com a Revolução Industrial é controversa.
Vários estudos contestam este conceito, alguns até defendem a idéia de que o sistema capitalista já existia desde a antiguidade.
Giovani Arrigui, autor de O longo século XX, defende a idéia de que o sistema capitalista nasceu no século XII, em Genova, com a intermediação de especiarias via mediterrâneo.
Nesta época teria se iniciado com primeiro ciclo de acumulação sistêmica capitalista, um conceito que expressa um período onde pessoas e instituições se capitalizaram, acumularam capital, sendo liderado por uma potência hegemônica.
No caso do século XII, a potência foi justamente Genova, com seus mercadores enriquecidos pelos comercio de especiarias importadas do Oriente, tendo inclusive participado das grandes navegações, no século XV e XVI, como investidores e financiadores das empreitadas.
O segundo ciclo de acumulação sistêmica do capitalismo teria sido iniciado no século XVI, liderado pela Holanda e centrado no transito marítimo de mercadorias, com potencias hegemônicas controlando entrepostos para exercer domínio sobre mercados e zonas produtoras de matéria-prima.
O terceiro ciclo teria sido liderado pela Inglaterra, iniciado no século XVIII, baseado no controle do fluxo naval por meio de uma grande armada de guerra.
O quarto ciclo teria se iniciado no século XX, tendo como potência hegemônica os Estados Unidos da América, quando começou um controle econômico financeiro deste país sobre o mundo, com intervenções armadas em nações que se recusavam a se submeter ao modelo econômico imposto.
Segundo Arrigui, a derrota norte-americana perante o Vietnã, na década de 1980, maçou o fim da hegemonia dos Estados Unidos da América e o surgimento de um novo líder a China, quando o sistema capitalista passou a sofrer um novo reajuste, ainda em movimento, marcando um novo ciclo no século XXI.
Destarte, o século XX, com o fordismo, a especialização das funções intensificou a compartimentação do sistema educacional, indo na contramão do humanismo renascentista, estreitando o vinculo entre economia e educação.
A partir deste momento, a educação ficou totalmente subordinada à economia, em outras palavras, passou a servir inteiramente aos sistemas econômicos.
A educação foi pensada para servir interesses econômicos e não para contribuir para aprimorar a vida em sociedade ou aprimorar a economia.
O sistema educacional passou a ter a obrigação não só de treinar a mão de obra, como também fazer girar a economia, formando mercado consumidor, elevando parcialmente o poder de consumo, através de indivíduos melhor qualificados tecnicamente.
A educação passou a se vista como um investimento econômico que deve gerar retorno para o Estado, servindo a reprodução e manutenção do sistema capitalista vigente.


Educação e desenvolvimento.
O desenvolvimento econômico de um país, dentro do âmbito do sistema capitalista, está estreitamente ligado a educação, uma vez que formadora dos recursos humanos necessários as sistema produtivo que faz a economia girar.
Os recursos humanos de que um país dispõe são formados pela população economicamente ativa e pela população que está sendo preparada para ingresso no mercado de trabalho ou está à espera de vagas.
Em um sentido contemporâneo, excetuando as pessoas que estão ativas ou ainda não ingressaram no mercado de trabalho, o restante forma o que chamamos mão de obra de reserva.
São indivíduos já formados, muitas vezes com experiência prática, mas que, por um motivo ou outro, está fora do mercado de trabalho.
Pensando por este prisma, seria função da educação criar condições para requalificar esta mão de obra, desenvolvendo e ampliando a distribuição de renda.
O sistema educacional deveria criar condições para formar mão de obra que renovasse os quadros, cada vez mais qualificada, para ingresso e recolocação no mercado de trabalho.
Entretanto, o desenvolvimento de um país, teoricamente, envolve não só a capacidade de produção, de atender, criar e aumentar a demanda por produtos; assim como desenvolver novas tecnologias.
Justamente, neste último item, onde entra a contribuição da educação novamente.
Ao formar e requalificar mão de obra, a educação deveria, simultaneamente, desenvolver novas tecnologias e conhecimentos, elevando salários e ampliando o mercado consumidor.
A ampliação de demanda seria criada pela elevação de salários e aumento da população economicamente ativa, criando um circulo virtuoso de abertura de novos postos de trabalho e maior demanda continuamente.
Ao mesmo tempo, ao lançar no mercado mais pessoas melhor preparadas, a educação deveria estimular a população economicamente ativa a buscar se aprimorar para se manter no mercado.
O que estimularia um ambiente de constante busca pelo conhecimento, possibilitando o surgimento de novas tecnologias.
No entanto, na prática, no Brasil não é assim que a economia funciona.
A ampliação do acesso a educação atende um projeto político e não econômico, que seria o correto.
No Brasil, a ampliação do acesso a educação não é acompanhada da manutenção da qualidade, entre outros fatores, conduzindo a formação de uma mão de obra barata, a qual substitui a mais qualificada para reduzir custos.
Uma dinâmica que cria um verdadeiro exército de reserva, baixando o nível salarial e desaquecendo a economia, já que reduz a demanda.
Esta redução de demanda é necessária, do ponto de vista governamental, porque não existe capacidade produtiva capaz de suprir o mercado com produtos no volume adequado, caso houvesse ampliação da renda e da demanda.
Porém, revela grande falta de planejamento governamental, pois terminando diminuindo a capacidade produtiva e o desenvolvimento tecnológico.
O circulo de desenvolvimento econômico brasileiro está invertido.
Mesmo com parte da população economicamente ativa, inserida no mercado de trabalho, sendo substituída por novos ingressantes que são formados continuamente pelo sistema educacional; boa parte dos recém formados não encontram uma colocação.
O mercado de trabalho não tem capacidade para absorver esta mão de obra no seu todo, tanto do ponto de vista daquele que tenta ingressar inicialmente, como daquele que buscou requalificação através da educação.
Uma das razões, além de um circulo vicioso, é que o sistema educacional brasileiro não dá conta de preparar para o mercado de trabalho, com efeitos negativos em todos os setores.
Neste sentido, a educação contribui muito pouco para o desenvolvimento econômico brasileiro, constituindo mero instrumento formador de mão de obra barata de reserva.
Existe uma disparidade entre o conhecimento fornecido pelo sistema educacional e as reais necessidades do sistema produtivo.
A educação no Brasil é extremamente academicista, desatualizada e dirigida e exercida por profissionais com baixa qualificação e preparo.
Na realidade, os baixos salários dos professores conduzem os bons profissionais, educadores por vocação, desistirem da área, deixando, na maior parte das vezes, as escolas entregues aos docentes de meio expediente, aqueles que enxergam na educação o que chamamos “bico”.
É a típica postura do profissional de área distante da educação que, para complementar sua renda, leciona nas horas vagas em uma escola de ensino fundamental e médio, chegando ao extremo de no ensino superior, dependendo do curso, ser esta uma regra.
O Brasil precisa de mais educadores e menos professores, precisa de mais profissionais da educação eu vivem apenas do seu trabalho na área.
Além deste componente, o desenvolvimento tecnológico mundial cada vez mais acelerado, em um mundo globalizado, faz o sistema educacional brasileiro parecer burocrático ao extremo, não acompanhando as necessidades do mercado de trabalho.
O que criou uma situação em que, em meio ao amplo desemprego, faltem profissionais qualificados em alguns setores, obrigando empresas a importar mão de obra e tentar elas próprias qualificar seus funcionários.
Este é um problema antigo no Brasil, remontando ao inicio da industrialização tardia na década de 1930, para os quais já se tentaram inúmeras soluções, todas fracassadas, já que não atacaram a raiz do problema: romper com um círculo econômico invertido.
Para tentar resolver este problema, desde a década de 1970, medidas governamentais recomendaram o incremento do ensino técnico.
Foi quando o IV Encontro de Secretários da Educação e Representantes de Conselhos de Educação, em 1973, fez a recomendação inicial, ressaltando que seria necessário criar intercâmbios com indústrias e universidades.
No entanto, a criação de cursos técnicos, vinculados com o ensino médio, não foi capaz de fazer o Brasil avançar no desenvolvimento econômico.
A maioria dos cursos técnicos nunca se tornaram operacionais, não fornecendo formação prática adequada.
Mesmo quando isto se fez possível, o número restrito de vagas não garantiu a satisfação da demanda no mercado de trabalho.
Na realidade, o tecnicismo educacional não fez mais que ampliar a formação de mão de obra barata, reduzindo o padrão de qualidade nas instituições de nível superior.


Educação e finanças públicas.
As finanças públicas consistem em estudos econômicos, realizados pelo governo (Estado), visando organizar as receitas para atenderem as despesas, teoricamente, buscando um equilíbrio no crédito.
Para organizar as finanças públicas, o Poder Executivo (presidente da República, governadores e prefeitos) elabora um orçamento, estimando a receita e fixando despesas, dentro de um intervalo de tempo denominado exercício fiscal.
Trata-se de uma estimativa porque a receita está baseada naquilo que se espera arrecadar com impostos.
O poder legislativo (senadores, deputados e vereadores) discuti a proposta, altera e aprova o orçamento, transformando em lei.
É interessante ressaltar que o orçamento público coordena as finanças do governo em âmbito federal, estadual e municipal; estabelecendo prioridades e seguindo diretrizes de contabilidade e administração.
Os gatos com educação fazem parte deste orçamento determinado pelas finanças públicas, fixado a partir de uma distribuição de recursos.
Esta distribuição considera inúmeros fatores, tal como a legislação, as políticas publicas, as diretrizes educacionais, econômicas, financeiras e sociais.
A despeito do projeto político partidário de quem está no poder condicionar todos os outros fatores.
Está fixado neste ponto um dos grandes problemas do orçamento destinado a educação no Brasil.
O sistema educacional é sempre pensado por políticos e não por especialistas em educação, fazendo as reais necessidades do sistema educacional não serem atendidas.


O orçamento da educação.
Os objetivos e diretrizes do sistema educacional são expressos, em termos financeiros, através do orçamento da educação, onde receitas e despesas são consideradas para organizar o exercício fiscal.
Neste sentido, ao menos teoricamente, o orçamento da educação leva em consideração:

1. Objetivos gerais e específicos de cada departamento, divisão, setor, escola, curso, turma, etc.
2. A situação atual e as necessidades de modificação, conforme seu funcionamento na prática, como por exemplo, os recursos técnicos disponíveis e sua qualidade e real disponibilidade de aplicação.
3. A articulação do trabalho a ser desenvolvido em cada ano fiscal e os planos de alcance mais amplo; como por exemplo, a necessidade de ampliação da rede escolar e a contratação de novos professores para atender esta ampliação.

A questão é que, mesmo admitindo que na prática exista um planejamento adequado, a valorização do professor como profissional altamente especializado e que necessita de constante reciclagem, através de uma política salarial adequada, em raras ocasiões acontece.
Destarte, para facilitar a elaboração de um orçamento da educação, cada setor colabora para classificar as despesas, encaixando-as em categorias, possibilitando a visualização dos investimentos necessários para manutenção e custeio dos serviços educacionais.
Em linhas gerais, a classificação das despesas envolveria categorias, tais como:

1. Material Permanente: móveis, equipamentos, construções, ampliações, etc.
2. Material de Consumo: material escolar, de limpeza, alimentos, uniformes, etc.
3. Despesas com Pessoal: salários e encargos sociais.
4. Outros Serviços e Encargos: serviços prestados por terceiros.

Outra questão se considerar, no orçamento da educação, é o fato do planejamento funcionar ao inverso do que procederia um cidadão para planejar seus gastos.
Primeiro estima-se as despesas, para, posteriormente, analisar as necessidades a serem atendidas e a ordem de prioridade.
Devido à importância que a educação tem para sociedade, existe uma legislação que determina cotas no orçamento geral, obrigando a aplicação no sistema educacional.

A Constituição de 1988, estabelece, na seção I, do Capítulo III, Título VIII:

Artigo 211: “A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino”.
1º. “A União organizará e financiará o sistema federal de ensino e dos territórios e prestará assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios para o desenvolvimento de seus sistemas de ensino e o atendimento prioritário à escolaridade obrigatória”.
2º. “Os municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e pré-escolar”.

Artigo 212: “A União aplicará, anualmente, nunca menos que dezoito, e os Estados, Distrito Federal e os Municípios vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos (...) na manutenção e desenvolvimento do ensino”.

É interessante ressaltar que o parágrafo 4º. do Artigo 212, determina que não podem ser computados, nestas porcentagens de gatos, programas suplementares de alimentação9 e assistência a saúde.
É também interessante ressaltar que escolas particulares também podem receber verbas publicas, desde que enquadradas como comunitárias, confessionais ou filantrópicas.
Para isto, devem comprovar finalidade não lucrativa e aplicação de excedente financeiro em educação.
Na prática, enquanto os municípios estão obrigados a investir prioritariamente no ensino fundamental e pré-escolar, os Estados devem cuidar do ensino médio e a União das universidades e escolas técnicas.
Porém, os recursos são insuficientes para romper com o ciclo econômico invertido e deturpado brasileiro, os recursos humanos, os professores, não possuem a necessária e merecida valorização orçamentária.


Concluindo.
Para além dos problemas conjunturais, devemos ressaltar que, apesar da legislação determinar percentuais mínimos para aplicação de recursos em educação, não regula a otimização, que fica a cargo do administrador escolar.
Não são contabilizados nos percentuais os recursos transferidos pela União aos Estados, ou dos Estados para os Municípios.
O ajuste entre despesas e receitas, para atender os percentuais fixados anualmente pela Constituição, deve ser apurado a cada trimestre do exercício financeiro e corrigido.
Pela lei, o repasse dos valores da União, dos Estados e Municípios deveria ocorrer imediatamente ao órgão responsável pela educação, sempre com um intervalo máximo de 20 dias entre a arrecadação e o repasse.
O atraso implica em correção monetária e responsabilização civil e criminal das autoridades competentes.
As leis são muito bonitas, mas, na verdade, a corrupção e a burocracia imperam todo o processo.
Para mudar a educação no Brasil é preciso alterar a ótica de pensamento e reformular as políticas públicas pensadas também no âmbito econômico.


Para saber mais sobre o assunto.
ARRIGUI, G. O longo século XX. São Paulo: UNESP, 1996.
BRANDÃO, C. F. “O financiamento da Educação Brasileira” In: Estrutura e Funcionamento do Ensino. São Paulo: Avercamp, 2004. p.92-99.
DOWBOR, L. Aspectos Econômicos da Educação. São Paulo: Ática, 1991.
FERNANDEZ ENGUITA, M. A Face Oculta da Escola: Educação e Trabalho no Currículo. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989.
FERRETTI, C. J. Trabalho, Formação e Currículo: Para Onde Vai a Escola? São Paulo: Xama, 1999.
MARTINS, J. P. “Economia e Finanças da Educação” In: Administração Escolar- uma abordagem crítica do processo administrativo em Educação. São Paulo: Editora Atlas, 1999. p.81-91.
RAMOS, Fábio Pestana. No tempo das especiarias: o império da pimenta e do açúcar. São Paulo: Contexto, 2004.


Texto: Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos.
Doutor em História Social pela FFLCH/USP.