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segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Reflexões acerca do inicio da utilização da mão de obra africana pelos portugueses no período colonial.

Para entender a história... ISSN 2179-4111. Ano 1, Volume out., Série 25/10, 2010.


A discussão historiográfica em torno da utilização da mão de obra de escravos negros no cultivo de produtos agrícolas, destinados principalmente à exportação, tal como o cultivo da cana de açúcar no Brasil e do algodão no sul dos Estados Unidos da América, vem sendo abordada por inúmeros historiadores com resultados extremamente proveitosos.
Não obstante, pouco ou quase nada se fala sobre as raízes e os primeiros anos da utilização da mão de obra africana, sobretudo pela Coroa portuguesa.
Além disto, conforme salientado por Yoro Fall, professor da Universidade de Dakar (Senegal), embora a escravidão seja um fenômeno complexo do ponto de vista histórico, muitos historiadores “insistem em conceber a escravatura não apenas como um fenômeno único e irredutível, mas também como um fato social uniforme e banal, sem que seja tomado em consideração à diversidade de suas origens, das suas funções e das suas modalidades”.
Assim, pensando nesta lacuna, pretendemos contribuir para um retroceder às origens da utilização da mão de obra escrava africana pelos portugueses, que mais tarde seria implantada no Brasil.

A escravidão africana quatrocentista.
Alguns cronistas, tal como um cronista anônimo do século XIX, em seu Índice cronológico das navegações, viagens, descobrimentos e conquistas dos portugueses nos países ultramarinos desde o principio do século XV, obra impressa em 1841, mencionam a chegada de escravos negros a Portugal a partir de 1428.
Foi quando o próprio Infante D. Henrique, na época a frente da organização da nobreza portuguesa em torno da continuidade da cruzada contra os infiéis rumo ao continente africano, organizou uma expedição corsária ao norte da África.
No entanto, caso levássemos em conta, como deixa claro o mesmo cronista, que a expansão portuguesa rumo à costa africana se iniciou no ano de 1412, seriamos tentados a concluir que a escravização de africanos provavelmente teria se iniciado nesta mesma data.
Porém, lembrando que os genoveses foram excomungados pelo Papa Martinho V em 1425, portanto dois anos antes do ano fixado como a data inicial da chegada dos primeiros escravos negros a Portugal, este panorama é alterado.
Justamente pelo fato dos lusos utilizarem escravos aprisionados no norte da África como mão de obra, toda e qualquer certeza desaparece.
Recorrendo ao cronista português, do século XV, Gomes Eanes de Zurara, mais especificamente à sua Crônica dos feitos de Guiné, temos no capítulo VIII, intitulado “Como Gil Eanes, natural de Lagos, foi o primeiro que passou o cabo do Bojador, e como lá tornou outra vez, e como ele Afonso Gonçalves Baldaia”, que Gil Eanes “trouxe certos cativos”, naturais das “ilhas de Canária”, “com que se tornou para o regno” no “ano de Jesus Cristo de mil e quatrocentos e trinta e três”.
Igualmente, bem Zurara afirma que, “em 1443 ou 1444”, a frente de “seis caravelas”, um escudeiro do infante D. Henrique, chamado “Lançarote”, teria se dirigido ao “Rio do Ouro”, com a missão de “capturar indígenas” africanos, retornando com uma “presa” de “duzentos e trinta e cinco” homens.
O cronista classifica os africanos aprisionados como “brutas animálias, com seu bestial sentir, por um natural instinto”, tendo sido estes desembarcados posteriormente em “oito” de “agosto”, em Lagos, “muito cedo pela manhã”, “os quais, postos juntamente naquele campo, era uma maravilhosa coisa de ver, porque entre eles havia alguns de razoada brancura, formosos e apostos; outros, menos brancos, que queriam semelhar pardos; outros tão negros como etiópios, tão desafeiçoados assim nas caras como nos corpos, que quase parecia aos homens que os esguardavam que viam as imagens do hemisfério mais baixo”.
Como nos prova o relato de Zurara, seja qual for a real data de inicio da utilização da mão de obra africana em Portugal, sobretudo negra, embora somente em 1455 uma bula Papal tenha concedido aos portugueses a autorização oficial para reduzir à servidão todos os infiéis, o procedimento já era pratica antes.
Em 1443, por exemplo, o aprisionamento de escravos havia se mostrado tão lucrativo a ponto da Coroa portuguesa ordenar a um escudeiro do Infante D. Henrique que se dirigisse ao norte da costa africana para buscar mais cativos.
Portanto, muito antes da primeira expedição inglesa de tráfico de escravos, realizada por Sir John Hawhins em 1562, durante ainda o século XV os portugueses estabeleceram um fluxo continuo de tráfico de escravos negros.
É interessante notar que o relato de Zurara mostra que a cor da pele foi o um o principal referencial que serviu de pretexto à escravização dos africanos, considerados pelos portugueses como não mais que animais.
Ao inverso, os africanos de pele mais clara eram considerados como muito formosos, e talvez tenha sido realmente este o principal argumento utilizado pela Coroa portuguesa junto ao Papado a fim de obter autorização da Igreja Católica para utilizar mão de obra escrava negra.
Por outro lado, não obstante ao fato dos negros terem sido inferiorizados pelos portugueses para justificar sua dominação, nem sempre os africanos foram considerados pelos portugueses como inferiores.
Na verdade creio que seria mais preciso dizer que o processo de inferiorização do negro ocorreu devido principalmente às diversas diferenças culturais observadas já nos primeiros encontros entre os navegantes lusos e os diversos povos da África.

Desencontros culturais.
Os primeiros encontros entre portugueses e africanos se processaram sob a ótica da estranheza de parte a parte.
Um missionário italiano, chamado “Bernardo de Gallo, no século XVII, recolheu” da “tradição oral” congoles o encontro da tripulação de Diogo Cão com o povo do Congo, entre 1482 e 1483.
O qual reflete exatamente o tipo de desentendimento cultural que deve ter ocorrido em épocas anteriores. 
Segundo este relato, “os negros do soio, vendo a novidade dos navios, sem saber que coisa aquilo era começaram a gritar com sinais de admiração, amindelle, amindelle [mundele, branco na significação actual, isto é, coisas como baleias, que vêm do mar; Ntelle, quer dizer baleia]”.
No atual território de Luanda, a chegada dos portugueses teve um impacto psicológico ainda maior, os africanos aterrorizados “tomam-nos como cadáveres vivos, os Vumbi”.
Segundo sua cosmologia “a estada dos defuntos” situava-se “na água e os espíritos dos antepassados” encarnavam “no outro mundo em corpos brancos e vermelhos”.
Saídos do mar os portugueses apareciam no domínio do sagrado e eram reverenciados como deuses na terra.
Gestos simples, gerados pela incompreensão da cultura do outro muitas vezes terminaram em conflitos sangrentos que mais tarde serviriam de pretexto à inferiorização do negro.
Quando Vasco da Gama passou pela África do Sul, por exemplo, o simples fato dos portugueses recusarem a comida oferecida pelos nativos originou um conflito.
Exatamente devido a desentendimentos culturais, várias expedições portuguesas foram dizimadas pelos africanos, como ocorreu com a expedição de Gonçalo de Cintra, em 1444, que “entrando por hum esteiro na ilha de Arguim, e ficando em sêcco á vasante da maré, foi accometido pelos barbaros, e morto com alguns seus companheiros”.
Ou ainda com a expedição de “Nuno Tristão”, em 1447, ao “Rio Grande”, quando sua embarcação foi “accommetid(a) de grande numero de bárbaros” que mataram muitos portugueses.
Como afirma o eminente historiador português Luís de Albuquerque, de fato as relações comerciais mais antigas entre portugueses e africanos remontam ao ano de 1341, no entanto, até o século XV estas relações forma esporádicas e na maior parte das vezes realizadas via intermediários mouros (islâmicos).
Até então, a impressão que os portugueses tinham dos africanos era a de um povo civilizado ligado ao comércio, até mesmo porque, embora desde o século XII tenham sido realizadas muitas expedições de missionários cristãos ao interior da África, as informações sobre a cultura e as religiões africanas eram, até a abertura da rota do Cabo, em 1434, desencontradas e fantasiosas.
Quando começam a ocorrer os primeiros contatos diretos entre os portugueses e os povos do interior da África propriamente ditos, os conflitos gerados pela incompreensão da cultura do outro, de parte a parte, converteram-se em um ódio que serviria de pretexto para inferiorização dos negros.
Apesar dos portugueses, pelas próprias características da formação de sua cultura; extremamente eclética onde residiam traços de diversas culturas da antiguidade, possuírem certa tolerância cultural, logo, a intolerância religiosa para com o outro gerou uma total indiferença.
O que gerou reflexos que culminaram no estatuto português do sangue.

O estatuto português do sangue.
Os desentendimentos culturais fizeram com que não tardasse surgir teóricos que, baseados na autoridade da Bíblia cristã, bem como em uma interpretação errada da mesma, passaram a inferiorizar os africanos.
A passagem da Bíblia cristã, contida em Gênesis 6-9, que conta como Noé salvou do dilúvio, “dos animais puros e impuros”, um casal de cada espécie, incluindo aí “seus filhos Sem, Cam, e Jafé”, passou a ter outra conotação.
Cada filho de Noé, com suas três mulheres, foram vistos como representantes da etnia amarela, negra e branca.
Ao passo que o relato que “Cam, o antepassado de Canaã”, o qual seria o representante da etnia negra, teria visto “seu pai nu”, quando este estava embriagado, e sem cobri-lo, teria saído para “contar” o que havia visto “a seus irmãos”, serviria de justificativa teórica para escravizar os africanos.
Segundo os teóricos da época, Cam e seus filhos estavam amaldiçoados por este motivo, ao que Jafé e Sem teriam caíram nas graças de Deus.
Puro pretexto que serviu à inferização dos africanos, dando vazão ao ódio acumulado pelos conflitos gerados pelos desentendimentos culturais.
O argumento dos teóricos para a inferiorização dos negros foi baseado nas palavras de Noé: “Maldito seja Canaã. Que ele seja o último dos escravos para seus irmãos. E (...) seja bendito Javé, o Deus de Sem, e que Canaã seja escravo de Sem. Que Deus faça Jafé prosperar, que ele more nas tendas de Sem, e Canaã seja seu escravo”.
Estes teóricos passaram a atribuir a Sem, tido como “chefe dos semitas”, a paternidade sobre a então chamada raça amarela; enquanto a paternidade sobre a etnia branca, ou européia, foi atribuída a Jafé, a quem cabia, segundo o Gênesis, que havia ordenado “que o senhor dilate Jafé”, o domínio sobre o mundo.
Neste sentido, para Cam, o filho que havia zombado “do pai quando, embriagado, dormia desnudo”, estaria reservada a escravização pelos brancos.

Cabe ressaltar que, como salientou Maria Luiza Tucci Carneiro, em seu Preconceito Racial: Portugal e Brasil-Colônia, de fato, até o “século XV, o preconceito não estava relacionado especificamente, ao antagonismo de raças”.

A aversão entre grupos estava presa às divergências religiosas existentes entre cristãos e infiéis, mas ao longo do século XV, com as grandes descobertas e a colonização de novas terras, os interesses políticos fizeram com que o confronto religioso, e, portanto, as diferenças culturais, fosse convertido em preconceito racial.
O que prova que a origem do racismo é antes política, social ou econômica, sendo usada pelos indivíduos para justificar seus interesses de exploração econômica, ou como pretexto para a dominação política.

A religiosidade lusitana.
Os portugueses sempre foram fervorosos cristãos, mas a instauração da Inquisição em Portugal transformou a fé em pura intolerância.
Segundo uma anedota medieval, os lusos eram famosos por queimar hereges em praça pública, enquanto o rei assistia saboreando seu sorvete importado da Itália, muito mais preocupado com o rápido derretimento da iguaria diante da fogueira do que com os pecados cometidos pelo infeliz que estava a ser queimado.
Diante deste cenário, quando os portugueses se viram diante de povos com referenciais diferentes dos seus, cultuando outros deuses, mais do que vincular a imagem do negro com um ser inferior, procuraram criar duvidas quanto à sua humanidade.
A pluralidade dos sistemas religiosos suscitou um círculo de contestação mútua, prenhe de conseqüências para todas as crenças tradicionais, embora entre os cristãos a presença da Inquisição tenha agravado este quadro.
Uma conseqüência clara desta campanha de desumanização do negro incitada pelos portugueses encontrou reflexo, séculos mais tarde, até mesmo entre os filósofos iluministas.
Voltaire e Rousseau chegaram a confundir as “tribos aborígenes” da África com “hordas de grandes símios antropoides”, enquanto o primeiro aproximou os negros aos macacos, o segundo se perguntou se “estes símios não eram humanos”.
A necessidade de justificar sua dominação sobre os povos da África e seu direito em escravizá-los, utilizando-os como mão de obra, fez os portugueses criarem novos signos étnicos e culturais.
Os portugueses procuraram associar a imagem do negro ao estereótipo medieval do demônio, segundo o qual “a cor negra é também a cor do castigo dos maus ou pecadores por oposição à cor branca da recompensa dos bons”.
Contribuiu muito para que esta estratégia funcionasse, a crença generalizada na Idade Média, de que o diabo sempre intervinha sob a forma de um animal negro, tal como um “cavalo negro”, ou uma “ave de cabeça negra”, e principalmente sob a forma humana de um negro.
Com isto, o próprio “termo etíope”, que vem de “aethiops”, que significa “face queimada”, passou a ser associada a “negritude do demônio”, sendo assimilada a cor negra dos africanos às “conseqüências do calor da zona tórrida” do inferno.
Entretanto, por um lado a diferença cultural levou os portugueses a buscarem a inferiorização do negro para justificar sua escravização; por outro, interesses econômicos também estimularam esta inferiorização.

Economia e Escravidão.
Portugal, país nascido da guerra de reconquista iniciada em 1096, a cruzada contra os muçulmanos que haviam se apossado da península Ibérica no século VIII, nasceu rico graças às pilhagens feitas aos mouros.
No entanto tais recursos rapidamente se esgotaram na continuidade da cruzada contra os infiéis, como, por exemplo, na manutenção de Ceuta, no norte da África, ou nas guerras de fronteira com Castela.
Além disto, os recursos se esvaíram na manutenção pela Coroa de uma nobreza parasitária.
Enquanto Portugal deixou ao relento seu escasso potencial agrícola, o que mais tarde acarretaria em graves conseqüências para o país.
Em um primeiro momento a continuidade da cruzada contra os mouros, veio somente aumentar a riqueza de Portugal.
A tomada de Ceuta, em 1415, foi precedida de diversas tentativas, e conseqüentemente de uma pilhagem contínua, movida pelos sacos de especiarias presentes na cidade.
Porém, quando Ceuta foi finalmente dominada pela Coroa portuguesa, passou a gerar prejuízo, uma vez que a cidade, sitiada pelos infiéis, sem a presença dos comerciantes sarracenos, nada valia.
Ceuta sob o domínio português era prejuízo certo devido às despesas com gastos com defesa contra os muçulmanos e aos respectivos custos com pessoal e armamento, contribuindo para o esvaziamento dos cofres do Estado.
As guerras de fronteira com Castela pela independência do condado Portucalense, que iria se transformar no Estado de Portugal, que duraram aproximadamente de 1383 a 1411, geraram uma grande quantidade de gastos para a Coroa portuguesa.
Provocaram uma enorme mortandade que iria contribuir para o esvaziamento do campo e para o conseqüente aumento da pobreza no reino.
Terminada a guerra com Castela, formou-se em torno do rei uma nobreza parasitária, que passou a viver às custas dos impostos extorquidos do povo.
Oprimidos por todos os lados, os camponeses fugiram para as poucas e escassas cidades existentes em Portugal.
Com o esvaziamento dos cofres do Estado, a única solução possível passou a ser aumentar os impostos sobre a produção agrícola.
No entanto dois terços do solo português eram demasiados rochosos, escarpados ou pedregosos para serem cultivados ou então o solo era tão pobre que não permitia senão colheitas incertas e inferiores.
O que era gravado pela falta de mão de obra no campo, que, por sua vez, havia fugido para as cidades justamente para escapar da exploração da nobreza e da Coroa, ou seja, em busca de melhores condições de vida.
Por este motivo, disposições várias, de lei geral e das municipalidades, tentaram prender a terra e coagir ao trabalho os braços úteis.
Não obstante o pelourinho, emblema da autoridade local no campo, usado para punir os camponeses muito antes de ser usado na punição dos escravos negros, fazia com que os camponeses continuassem a fugir para as cidades.
Dentro deste contexto, a expansão ultramarina surgiu como a única alternativa visando ocupar a mão de obra ociosa nas cidades, canalizar a belicosidade da nobreza portuguesa e arrecadar recursos financeiros.
Foi quando a escravização dos africanos apareceu, não só como forma de obter lucro para a Coroa, como também obter a mão de obra necessária a agricultura portuguesa.
Como bem salientou Vitorino Magalhães Godinho, em seu clássico Os descobrimentos e a economia Mundial, ao contrário do que muitos imaginam, já em 1402 “foram feitos” em um único ano “uns 400 cativos” aprisionados somente na “ilha do Ferro”, no norte da África.
O que vinha de encontro à necessidade causada pela “rarefacção da mão-de-obra no século XIV”, atendendo “as exigências das plantações e engenhos de açúcar” recém instalados.
Depois do descobrimento da ilha de Porto Santo por Bartolomeu Perestrello, em 1418, da Ilha da Madeira por João Gonçalvez Zarco e Tristão Vaz, no ano seguinte, e o conseqüente inicio da povoação destas ilhas de solo extremamente fértil, em 1425, a necessidade de obter mão de obra barata para cultivar estas terras tornou-se uma prioridade para o Estado português.
Havia se inicia o cultivo da malvasia, importada de Creta, e da cana-de-açúcar, vinda da Sicília, o que exigia braços fortes para cultivar os campos.
Uma situação intensificada depois da descoberta dos Açores, em 1427, embora suas terras não fossem tão férteis quanto às da ilha da Madeira.
Simultaneamente, os portugueses tinham iniciado o cultivo da cana-de-açúcar no Algarve, no sul de Portugal, onde o solo arenoso e pedregoso, exigindo a canalização de uma mão de obra robusta e numerosa no reino e nas ilhas que tinham sido descobertas.
Ao contrário do que ocorreu inicialmente na Georgia, no sul dos Estados Unidos da América, conforme relatado por Eric Williams, em seu brilhante Capitalismo e Escravidão; para o Estado português não se tratava de obter uma mão de obra que viesse a substituir os numerosos servos brancos.
No caso norte-americano, os camponeses haviam sido deportados da Europa pelos mais diversos motivos, inicialmente servindo como mão de obra barata, depois se dispersando ante a imensidão das novas terras, trabalhando por conta própria, tornando-se pequenos proprietários.
Uma situação bem diferente do que aconteceu nas colônias de Portugal, onde não existiam homens suficientes para cultivar nem mesmo as terras do reino, quanto mais às novas e promissoras possessões que se descobriam de tempos em tempos.
Os poucos homens disponíveis em Portugal precisavam ser recrutados para servir nos navios, feitorias e fortalezas pertencentes a Coroa portuguesa, constituindo uma escassez de recursos humanos que seria uma das causas da ruína do Império lusitano no Oriente.
Deste modo, a utilização da mão de obra negra pelos portugueses, foi essencial não só no cultivo da cana-de-açúcar, como também nas tarefas mais essenciais ao desbravamento das novas terras descobertas.
Tome-se como exemplo a construção de estradas talhadas na rocha por escravos no acidentado relevo da Ilha da Madeira.
A mão de obra escrava africana tornou-se desde muito cedo uma saída à escassez do componente humano servil branco, o qual havia sucumbido primeiro a guerra de reconquista e depois às guerras com Castela pela independência do condado Portucalense.
Questão de falta de gente que foi agravada pela continuidade da cruzada contra os infiéis, representada pela expansão ultramarina, pois como sabemos o índice de mortalidade a bordo das embarcações portuguesas e nas feitorias era altíssimo mesmo para a época.
De fato, a utilização de mão de obra escrava acabou por ajustar-se às necessidades da Coroa portuguesa e de seus súditos.
Ainda em 1480, a exportação do açúcar da Madeira havia obtido tal sucesso que “necessitava de 20 navios e cerca de 50 embarcações mais ligeiras” para escoar sua produção.
Mesmo assim a falta de homens para servirem como senhores era tão grande que estes eram recrutados “tanto na aristocracia portuguesa como entre categorias sociais menos afortunadas” e mesmo “entre outros europeus: genoveses, florentinos e flamengos”.

A legislação reguladora e legitimadora do tráfico de escravos.
Podemos afirmar categoricamente que sem a mão de obra escrava os empreendimentos lusitanos seriam simplesmente impossíveis.
Exatamente por este motivo, estimulados, mais tarde, também pelo inicio do cultivo da cana-de-açúcar no Brasil no século XVI, diante da crescente utilização da mão de obra de escravos negros, os portugueses logo providenciaram a normatização do trato e comercio de escravos.
Foi estabelecida a chamada Carreira da Guiné, ou seja, o tráfico luso-africano de escravos de forma continua e regular, inaugurado pela criação da feitoria de Arguim, na atual costa da Mauritânia, em 1448.
Através do Regimento das Cazas das Indias e Mina, “Feyttto em Evora, a tres dias do mês de julho, anno de nosso Senhor Jesus Christo de mil quinhentos e nove”, a Coroa portuguesa procurou fixar regras para preservar o lucrativo comercio de escravos.
Este foi um dos poucos manuscritos que sobreviveram ao incêndio causado pelo grande terremoto de 1755, o qual deixou boa parte de Lisboa sobre escombros.
Por meio do documento, a Coroa portuguesa procurou impedir que os nativos adquirissem tecnologia militar européia, visando manter sua supremacia sobre os nativos.
Os africanos tinham então o habito de, durante todo século XV, XVI e parte do XVII, capturar inimigos de tribos vizinhas vendendo-os aos portugueses a troco de alguns panos, produto escasso e valorizado na África.
O capítulo 15o do dito Regimento afirma que deveriam ser aplicadas “penas (...) aquelles que vendem mercadorias defezas aos negros, ressalvando porem que, se as armas que sam obrigados ter por nosso Regimento enquanto lá esteverem as quizerem vender aos moradores da ditta cidade, o podem fazer porque pera ello lhe damos lugar”.
Isto por ser de conhecimento geral, mesmo na época, que muitos soldados recém chegados às feitorias portuguesas não tinham outro recurso para sobreviver a não ser “empenh(ar) ou vende(r) a capa ou a espada se a levam”.
Cabe ressaltar, no tocante a tal questão, que na África, uma das formas mais comuns de resistir à invasão dos portugueses, por mais estranho que possa parecer, foi a escravização de uma tribo por outra.
Só em data relativamente recente as palavras pirata e corsário começaram a aparecer carregadas de um significado pejorativo que de modo algum tinham nos séculos XIV e XV.
Desde o inicio da expansão portuguesa rumo à África, a utilização de corsários a serviço do Rei foi muito comum, a ponto mesmo de serem tratados em pé de igualdade e até confundidos por D. Dinis com marinheiros da frota real.

Formas diferentes de resistir à escravização.
Depois que os portugueses colocaram os pés pela primeira vez na África, diante dos conflitos gerados pelas diferenças culturais, como já demostramos, sua fama de crueldade, bem como de invencíveis guerreiros, correu rapidamente todo continente.
À medida que os portugueses avançavam pela África, mais os nativos se convenciam que à única forma de resistir aqueles corsários e piratas, que andavam a busca de ouro e escravos, seria buscar a amizade dos estranhos.
A escravização dos prisioneiros de guerra pelos africanos, como no mundo antigo europeu, era muito comum.
Quando os portugueses chegaram fazia parte da cultura africana há séculos, deste modo, os reis, homens ricos e mercadores proeminentes da África aceitaram o comércio de escravos proposto pelos portugueses, assim como as vantagens que este lhes trazia, enxergando na proposta uma excelente oportunidade para fazer amizade com os portugueses.
Embora muitos lideres africanos tenham aceitado vender inimigos cativos devido à sua própria avidez pelas mercadorias oferecidas em troca pelos portugueses, a maior parte deles tinha consciência de que recusar vender cativos poderia trazer problemas.
Quando uma tribo se negava a vender escravos, outra aceitava, o que implicava em um risco daquele que se negasse ver seu povo escravizado por aliados dos portugueses.
Na maior parte dos casos, o comércio de escravos era arrendado a particulares pela Coroa portuguesa, oferecendo pelos cativos; além de tabaco, barras de ferro, pulseiras de cobre, peças de algodão ou conchas de caurim; muitas vezes armas de fogo, a despeito das proibições.
Estas armas, mais tarde, eram utilizadas na autodefesa contra os próprios portugueses, daí a fixação de regras impedindo a troca de escravos por armas, as quais não eram respeitadas.

A defesa das feitorias e fortalezas.
Sabendo do perigo representado pela aquisição de armas de fogo pelos africanos, sobretudo para a manutenção de suas feitorias ao longo da costa da África, a Coroa portuguesa procurou garantir que seus súditos presentes nas feitorias ficassem sempre prontos para a necessidade de defender-se do ataque nativo.
O Regimento das Cazas das Indias e Mina determinava, no seu 16o capitulo, que “o capittam, Alcaide mor, Feyttor, Escrivaens da Feittoria y todollos outros (...) officiaes (...) y moradores della” devem ser “obrigados a ter, emquanto nella esteverem, estas armas (...): coirassas, y capacetes, e babeiras, e lasas, e bestas com todo seu aparelho e com duzentos tiros pera ellas, sem as quaes armas nam ham de vencer soldo nem lhe há de ser pago”.
Ao mesmo tempo em que procurou prevenir seus súditos acerca do perigo representado pelo fornecimento de armas de fogo aos africanos, bem como normatizar a preparação militar contra possíveis ataques nativos, a Coroa recomendou que os portugueses, presentes nas feitorias, tratassem bem aos mercadores negros que lhes vendiam escravos para não despertar sua ira e manter os africanos divididos entre si.
O Regimento, no seu 59o capitulo, recomendava “que sejam bem tratados os mercadores”, pois segundo a Coroa portuguesa “huma das principais couzas em que consiste nosso serviço hé que os mercadores y pessoas que trautam em nossas Caazas (...) sejam (...) bem ouvidos respondidos, y despachados de todos nossos officiaes y de modo que possam hir contentes y do seu bem livrados, y com rezam y justissa, e que em nenhuma couza possam receber aggravo nem escandallo”.
A Coroa tinha plena consciência de que em um confronto direto contra os nativos, os portugueses, devido à superioridade numérica dos africanos, certamente levariam a pior, o que era comprovado pela experiência.
Deste modo, aliar-se a alguns chefes africanos e incentivar a rivalidade entre as tribos era a única forma de manter as feitorias portuguesas ao longo do litoral africano seguras.
O que não livrou as mesmas de ataques ocasionais e um cerco constante por parte dos nativos.
Na maior parte das vezes, os africanos terminavam isolando os portugueses, confinando-os ao interior das muralhas de suas fortalezas.
O que forçava os habitantes das feitorias a tentarem cultivar produtos agrícolas destinados à sua subsistência e a negociar com os africanos para obter, além de escravos, alimentos, forçando também a Coroa a abastecer suas fortalezas ao longo do litoral através de sua frota naval.

A administração estatal do tráfico.
Desde o inicio do século XVI, o tráfico de escravos, ao lado do comércio de pimenta malagueta e marfim, já havia se tornado um negócio tão importante para a Coroa portuguesa quanto à intermediação de produtos da Índia.
O negócio era então arrendado aos particulares em troca de uma porcentagem que girava em torno de 20% do valor dos escravos transportados.
Para controlar a entrada e saída de escravos o Estado criou, sob a tutela da Casa da Guiné e da Mina, órgão responsável pela arrecadação de impostos sobre os produtos vindos da África, a Feitoria da Casa da Guiné.
O principal encarregado de reverter os lucros dos particulares em forma de impostos era o Almoxarife e Escrivão dos Escravos, um funcionário da Coroa responsável pela fiscalização da entrada ou passagem de escravos por Portugal e pela concessão do arrendamento do tráfico negreiro aos particulares.
Cabe notar que o Almoxarife e Escrivão dos Escravos, fixado em Lisboa, tinha sobre seu comando uma equipe formada tanto por homens livres, contratados pela Coroa, como por escravos, ironicamente forçados a servirem na fiscalização do tráfico negreiro.
O procedimento adotado quando por ocasião da chegada de embarcações em Portugal, quer transportando escravos ou não, contanto que estas viessem dos “ryos, ou de quaisquer outras partes da Guiné”, era fixado pelo Regimento das Casas das Índias e Mina de 1509.
Consistia em verificar “se trazem algum ouro, escravos e couzas outras”, averiguação procedida pelo Feitor, junto com o Tesoureiro e o Escrivão da Casa da Guiné, em conjunto com o Almoxarife e Escrivão dos Escravos.
Antes mesmo da “embarcação lançar o batel fora”, para evitar que os capitães de embarcações sonegassem a parte que cabia ao Estado pelas mercadorias transportadas, os funcionários da Coroa subiam a bordo.
Caso fosse verificada a presença de escravos, o “Almoxarife delles” deveria “entregar os dittos escravos” ao “Thezoureiro”, o qual ficaria encarregado de declarar o seu valor “em receita pera sua conta”.
“Logo então, ou em esses dia, se poder ser, y se não a outro dia seguinte”, na presença do “feytor, com os dittos thezoureiros, Escrivães (...) avaliavam os dittos escravos (...) cada peça por sy em sua justa valha segundo melhor entenderem”, escrevendo “os preços, que lhe forem postos, em escritos de purgaminho que se lançaram aos pescossos dos dittos escravos, pera se saberem, pollo escripto de cada hum, a valha que tem; e feita a ditta avaliação”.
“O ditto (...) Feittor a fará logo assentar no livro da recepta do ditto almoxarife” dos Escravos, “na adição da recpta dos dittos escravos, (...) que os dittos escravos da vinda do tal navio valem por suas avaliaçoens tantos mil reis”.
Segundo a mesma determinação de 1509, caberia além do procedimento já descrito visando impedir a sonegação de impostos, ao Almoxarife dos Escravos, “emquanto os dittos escravos estiverem em poder” deste, os “ver y vezittar y fazer cura, de maneira que por mingoa do bem trauto y cura nom moyram nem se percão alguns, como muntas vezes acontesse”.
Pois o procedimento mais corriqueiro era de que os escravos ficassem confinados nos porões dos navios onde haviam sido transportados da África até o Reino até que fossem totalmente contabilizados, “e achandosse nos dittos navios algumas couzas que pera hajam darrecadar” e que não haviam sido listado preliminarmente, ou seja, que por ventura tivessem sido ocultadas pelo capitão da embarcação ou por algum oficial, visando fugir da pagamento de impostos a Coroa, “alem de se fazer arrecadação disso (...) se procederá contra as pessoas que nisso forem culpadas” punição.
Ao que tudo indica, apesar do procedimento parecer uma maneira eficiente de evitar a sonegação, este modo de agir trouxe mais prejuízo do que lucro não só ao Estado como também aos particulares.
O confinamento dos escravos, já exaustos e desgastados pelo transporte, nos porões das embarcações, fazia com que muitos não conseguissem resistir.
Diga-se de passagem, os africanos aprisionados pelos portugueses, principalmente no século XVI, eram transportados em navios onde o ambiente era muito mais insalubre do que nos navios negreiros ingleses do século XVIII, descritos por Eric Williams.
Este autor se mostra horrorizado diante do contraste oferecido pelo espaço disponibilizado aos emigrantes brancos transportados nos navios ingleses, quando “cada trabalhador tinha direito a aproximadamente 60 centímetros de largura e 185 centímetros de comprimento na cama”.
A seu ver, o que já representava condições deploráveis de transporte.
Isto, em oposição ao espaço concedido a cada escravo na travessia do Atlântico, que media 1,67 metros de comprimento por 40 centímetros de largura, o que ele classificou como um “caixão de defunto”.
O que diria Williams se soubesse que, no século XVI e grande parte do XVII, os tripulantes, soldados, e passageiros das embarcações portuguesas da Carreira da Índia, sendo que estes últimos haviam pagado para serem transportados, dispunham cada um de não mais que 50 centímetros quadrados a bordo.
O que nos leva a imaginar que o espaço por escravo transportado nas embarcações portuguesas era sem dúvida bem menor do que o disponível nos navios negreiros ingleses.
Desta forma, depois de serem transportados em condições inimagináveis e de sofrerem maus tratos inimagináveis, os africanos que chegavam vivos em Portugal encontravam-se em péssimas condições de saúde.
Os africanos transformados em mercadoria eram confinados, devido às determinações gananciosas da Coroa, aos porões das embarcações, terminando, em sua grande maioria, perecendo.
Exatamente devido este fato, em 1575, a Coroa lançou uma emenda ao seu Regimento das Casas das Índias e Mina, determinando, muito mais devido a razões econômicas que humanitárias, que, depois de um levantamento preliminar feito por seus funcionários na embarcação “ante de lançar o batel fora”, os “dittos escravos se levaram a terra y se poeram na caza ordemnada, em que os tem o ditto Almoxarife” dos Escravos.
O funcionário da Coroa ficava responsável por verificar se a quantidade de escravos estava de acordo com o levantamento preliminar feito a bordo da embarcação, somente em terra, quando finalmente, só então, eram iniciados os procedimentos usuais, antes realizados a bordo dos navios, de avaliação e marcação dos escravos para serem taxados.
Não sabemos se a medida surtiu efeito na diminuição da mortalidade entre os escravos recém chegados ao reino, contudo, podemos afirmar que a medida reflete uma nítida preocupação da Coroa para com seu lucro.
Escravo morto não podia ser taxado.
Uma medida que revela que muitos negros, pelos mais diversos motivos, entre eles provavelmente os maus tratos e quem sabe muitos suicídios, faleciam após terem chegado ao seu destino.
Isto é claro, além dos que já de certo haviam perecido ao longo da viagem a bordo das embarcações portuguesas.
De qualquer modo, a mesma emenda de 1575 procurava determinar com precisão o procedimento a ser adotado “com os escravos que vierem doentes”, algo que as recomendações de 1509 não faziam.
A Coroa determinou que, quando “vierem escravos tam doentes y mal tractados que por taes se nam podem vender, nem os quer nimguem comprar, nem se lhe pode então poer preço per que se vendam”, o Almoxarife dos Escravos “teha muy grande cuidado de os curar, em maneira que por mingoa disso se não acabem de perder, y a despeza que nisso fezer será parante seu escrivão y nam doutra maneira; y como foram sãos ou em dispozição que se possam vender, o ditto Almoxarife com seu escrivão os levarão ao ditto Feyttor, Thezoureiro e escrivaens da Caza” da Guiné.
Só então estes escravos eram avaliados “nos preços que lhes parescer pera logo terem sahida e nom fazerem despeza na Caza sem necessidade”.
A própria existência da determinação desta medida nos mostra, por si só, mesmo que não exista um único documento que comprove esta hipótese, que muitos capitães afirmavam que parte dos escravos transportados estavam tão doentes que não poderiam ser taxados.
Diante deste artifício, a Coroa acabou por determinar que ela ficaria encarregada de cuidar dos escravos que chegassem doentes, e que, caso fossem eles curados, seriam avaliados e taxados como escravos sadios, sendo descontado de seu dono as despesas com sua cura.
Visando se precaver contra um possível prejuízo na aplicação desta medida, a Coroa portuguesa determinou ainda que “sendo alguns” escravos “tam doentes que curandosse na Caza dos escravos paresça ao Feyttor y officiaes com informações dalguma fizico que sua vida será duvidosa, achando pessoas que queiram logo levar y curar á sua custa a qualquer partido sobre o preço que os taes escravos depois valerem, o faram de maneira que se aproveite nisso todo o que ser poder, dando avizo ás taes pessoas que, se os dittos escravos chegarem a ponto de morte, o fação primeiro saber ao ditto Almoxarife y escrivão pera os hirem ver por sy y serem certos de seus falecimentos, y que sam aqueles y nam outros”.
Deste modo, pela emenda de 1575, que se encontra inserida no texto original de 1509, a Coroa tomava para si a responsabilidade pela cura dos escravos que chegassem doentes ao Reino, tirando-os da tutela do capitão da embarcação.
Na prática procurava evitar a permanência da mercadoria humana em um ambiente insalubre que poderia levar a morte e gerar prejuízos, abrindo a oportunidade aos particulares para que comprassem escravos a valores mais acessíveis.
Estes escravos, depois de tratados na Casa da Guiné, ainda caso continuassem doentes, podiam ser retirados pelos interessados sem o pagamento de impostos, devendo para tal, pagar seu valor atual com a promessa de inteirar o pagamento quando e se recuperassem a saúde.

Concluindo.
Justificado e normatizado pela Coroa portuguesa, pôde o tráfico de escravos expandir-se também para o Brasil.
Com o crescente número de naufrágios na Carreira da Índia e a conseqüente migração da mão de obra livre e dos investidores desta última para a Carreira do Brasil, a necessidade de mão de obra foi crescendo na mesma proporção.
O incremento do aproveitamento econômico do Brasil começou a crescer, a rigor, depois da década de 30 do século XVI, no entanto, ganhando notoriedade somente depois do declínio definitivo da Carreira da Índia no século XVII.
A importante medida administrativa das Cortes de 1472-1473 e de 1481-1482, que estipulava “que um senhor, tendo pago os direitos de entrada de um escravo, poderia circular com ele, sem pagar de novo as taxas devidas ao Estado”, acabou por estimular uma migração em massa para o Brasil (...) de levas de senhores com seus escravos.
Estes senhores terminam por construir engenhos de açúcar que prosperam e estimulam a importação de mais escravos e a chegada de novos portugueses ansiosos por tornarem-se também eles senhores de engenho.  
Assim, em pouco tempo se estabeleceu entre o Brasil e sua metrópole, a semelhança do que aconteceu com a Inglaterra e algumas de suas colônias, o que Eric Williams chamou de comércio triangular.
O Brasil tornou-se o grande fornecedor de matérias primas para Portugal e importador de escravos.
Portugal por seu turno passou a monopolizar estes produtos primários vindos do Brasil, tornando-se o grande intermediário que revendia estes produtos na Europa.
O capital acumulado pela Metrópole, porém, era revertido para a compra de produtos manufaturados, principalmente da Inglaterra, repassando posteriormente aos súditos da Coroa portuguesa no Brasil.
Com isto Portugal começou, cada vez mais, a empobrecer, enquanto a Inglaterra prosperou e, por sua vez, a colonização do Brasil, que se tornaria independente em 1822, foi impulsionada, entre outros fatores, pelas mãos dos escravos africanos.

Para saber mais sobre o assunto.
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RAMOS, Fábio Pestana. Por mares nunca dantes navegados. São Paulo: Contexto, 2008.
PERES, Damião (compilação, organização, e introdução). Regimento das Cazas das Indias e Mina. Coimbra: Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra-Instituto de Estudos Históricos Dr. António de Vasconcelos (edição subsidiada pelo Fundo Sá Pinto), 1947.
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WILLIAMS, Eric. Capitalismo e Escravidão. Tradução do inglês e notas de Carlos Nayfeld, Rio de Janeiro: Companhia Editora Americana, 1964.

Texto:

Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos.
Doutor em Ciências Humanas - USP.
MBA em Gestão de Pessoas - UNIA.
Licenciado em Filosofia - FE/USP.
Bacharel em Filosofia - FFLCH/USP.



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Forte abraço.
Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos.

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