Para entender a história... ISSN 2179-4111.
Ano 4, Volume jul., Série 01/07, 2013, p.01-06.
Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos.
Doutor em história
social - USP.
MBA em Gestão de
Pessoas - UNIA.
Licenciado em história -
CEUCLAR.
Licenciado em filosofia
- FE/USP.
Bacharel em filosofia -
FFLCH/USP.
Introdução.
O
cristianismo nasceu como uma seita que se destacava entre muitas outras
oriundas do Oriente.
Começou
humildemente, com um grupo de discípulos que haviam presenciado a vida terrena
de seu mestre espiritual, Jesus Cristo, relatando o supostamente observado.
Os
seguidores desta época eram pessoas humildes, cujos ensinamentos cristãos
vinham ao encontro dos desejos e necessidades.
O
gênio e a energia do apóstolo Paulo transformaram o cristianismo em uma liga de
sociedades bem organizadas, espalhadas por todo o Oriente e que conseguiu abrir
caminho até a Itália.
Partindo
dos ensinamentos de Cristo, Paulo preparou as bases da teologia e escatologia
cristã, construindo os fundamentos de uma Igreja Católica Universal.
Apesar
da relativa penetração entre as camadas sociais mais pobres, tratando-se de
convencer os letrados, a nova fé não obteve o mesmo sucesso.
Exatamente
por esta razão, as comunidades cristãs entraram em choque com o poder civil da
época, notadamente com funcionários que representavam o imperador romano.
Fazia-se
necessário legitimar a fé cristã racionalmente.
Para
atender a demanda, um dos pioneiros foi Orígenes, que estabeleceu uma conexão
permanente entre religião e filosofia.
Seguido
depois por Santo Agostinho, o grande responsável pela releitura da filosofia
grega dentro do âmbito cristão.
A legitimação racional do
cristianismo.
A
única maneira encontrada pelos cristãos de tornar a sua doutrina inteligível, acessível
e aceitável para as camadas mais abastadas da população foi legitimar a
teologia através da antiga filosofia grega, esta conhecida e aceita,
encaixando-se na intenção de persuadir e convencer racionalmente.
É
dentro deste contexto que emergiu a figura de Aurélio Agostinho, mais conhecido
como Santo Agostinho, o grande filosofo e doutor da Igreja Católica Ocidental.
Ela
havia lido clássicos como Hortênsio, de Cicero (obra hoje perdida), centrada na
profundidade do sentir e no poder compreensivo, inspirando a fundir o caráter
especulativo grego com a praticidade latina.
Agostinho
considerava a filosofia como solucionadora do problema da vida, ao qual só o
cristianismo poderia fornecer uma solução integral.
Seu
interesse estava, portanto, circunscrito aos problemas de Deus e da alma, visto
serem os mais importantes e imediatos para a solução integral da questão da
alma.
Partindo
desta premissa, procurou legitimar a fé por meio da filosofia platônica.
Iniciou
a superação do ceticismo mediante a doutrina grega, começando por conquistar
uma certeza: a própria existência espiritual.
A
partir deste pressuposto, chegou a uma verdade superior e imutável, condição e
origem de toda vida particular.
Embora
desvalorizando o sensível em relação ao intelectual, admitiu que os sentidos,
como o intelecto, seriam a fonte do conhecimento.
Sendo
necessário para visão sensível, além do olho e do que chamou de coisa, a luz
física, do mesmo modo que a luz espiritual seria necessária para o conhecimento
intelectual.
A
luz espiritual proveria de Deus, sendo ele próprio manifestado através do
verbo, para o qual transferiu as ideias platônicas.
No
verbo de Deus existiriam as verdades eternas, as ideias, as espécies e os princípios
formais das coisas.
Seriam
modelos dos seres criados, o conhecimento das verdades eternas e as ideias das
coisas reais que apreendemos através da luz intelectual que vêm do verbo de
Deus.
Portanto,
a percepção de tudo estaria vinculada com o inatismo, a reminiscência
platônica.
Diferente
de Platão, para Agostinho, o verdadeiro conhecimento não estaria somente nas
ideias; mas sim também nas forças naturais do espírito vinculadas com a
iluminação de Deus.
Este
seria inteiramente intangível e transposto ao mundo puramente intelectual, o
que criou a questão de como provar a existência de um Deus não palpável.
A existência de Deus e da alma.
Agostinho
prova a existência de Deus através da fundamentação a priori, já que no espírito humano haveria uma existência deste
ser.
Ao
lado desta prova, não nega as relações a
posteriori da existência de Deus, afirmando que a imperfeição e sua
transformação seriam efeitos da relação com o espiritual.
A
natureza de Deus seria o poder racional e infinito, visto que não poderia se
medido; portanto, eterno e mutável, caracterizando o livre criador.
Uma
hipótese antes excluída pelo pensamento grego, onde existia um dualismo
metafísico, pois algo não poderia ser ao mesmo tempo racional e infinito, tampouco
eterno e mutável.
Este
dualismo só permanece na argumentação moral de Agostinho, especificamente na
doutrina do livre arbítrio que pode conduzir ao pecado, fazendo o homem
insurgir orgulhosamente contra Deus.
No
cristianismo, o mal é, metafisicamente, negação da vontade de Deus.
Agostinho
harmoniza este preceito com o platonismo, uma vez que não sendo o corpo mau por
natureza, a matéria não pode ser essencialmente má, pois foi criada por Deus,
que fez todas as coisas boas.
A
união do corpo com a alma é acidental, nasce com o individuo enquanto criação
divina.
Neste
sentido, embora o copo seja mutável, a alma é eterna, sendo de natureza simples
e parte da complexidade de Deus.
O livre arbítrio.
Segundo
Agostinho, a vontade é livre, e pode querer o mal, pois é um ser limitado,
podendo agir desordenadamente, imoralmente, contra a vontade de Deus.
Neste
caso, a vontade humana é má; é única coisa má no mundo criado por Deus.
Portanto,
não é causa eficiente da ação viciosa, uma vez que o mal não tem realidade
metafísica.
O
pecado tem em si mesmo a pena da desordem, já que a criatura não podendo lesar
Deus, prejudica a si mesma, determinando e dilacerando sua natureza.
A
vontade humana é impotente sem a graça de Deus, conciliando a causalidade com o
livre arbítrio do homem.
Neste
sentido, por exemplo, a escravidão não seria um direito natural, mas consequência
do pecado original, que perturbou a natureza humana a partir da escolha pelo
mal advinda do livre arbítrio.
A
corrupção da natureza humana, no entanto, poderia ser superada pela
transformação racional operada pela fé cristã.
Concluindo.
Santo
Agostinho conciliou razão e fé, forjando uma racionalidade adequada para o convencimento
dos intelectuais latinos.
Ao
fazê-lo, resolveu o problema do mau, explicando-o como metafísico, negando sua
realidade física, deslocada para o mundo espiritual.
Quanto
ao mal físico, que atinge também a perfeição natural dos seres, procurou
justifica-la mediante o contraste dos seres, o que contribuiria para a harmonia
do conjunto.
Ele
admite o mal moral, relegando sua causa a vontade do homem e não de Deus, caracterizado
por privação do bem, resultante de uma escolha equivocada do livre arbítrio.
Seguindo
este raciocínio, Agostinho exporia uma visão orgânica da história humana na
obra A cidade de Deus.
A
partir de uma visão grandiosa da história, propriamente teológica e não filosófica,
traçaria uma doutrina cristã, unindo a religião com a filosofia antiga,
revelando a interioridade racional do ser espiritual.
Para saber mais sobre o assunto.
AGOSTINHO.
Os pensadores: volume Santo Agostinho. São
Paulo: Abril, s.d.
ARIÈS,
Philippe; DUBY, George (dir.). História
da vida privada: volume 1. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.
BOWDER,
Diana. Quem foi quem na Roma antiga. São
Paulo: Circulo do Livro, 1980.
PADOVANI,
Umberto; CASTAGNOLA, Luís. História da
filosofia. São Paulo: Melhoramentos, 1990.
ROSTOVTZEFF,
M. História de Roma. Rio de Janeiro:
Guanabara, 1983.
RESUMO:
a parir de uma interpretação livre das obras de Santo Agostinho, pretende-se
discutir a operacionalização da conciliação entre fé cristã e filosofia grega,
considerando-se a questão da existência de Deus e da alma, além do problema do
livre arbítrio.
Palavras-Chave:
Santo Agostinho, Livre Arbítrio, Existência de Deus e da alma, Legitimação da
fé cristã.
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Forte abraço.
Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos.
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