Para entender a
história... ISSN 2179-4111. Ano 3, Vol. ago., Série
01/08, 2012, p.01-05.
“Nas
coisas tudo está regulado de uma vez por todas com tanta ordem e correspondência
quanto possível, pois a suprema sabedoria e bondade só pode atuar com perfeita
harmonia: o presente está gravido do futuro, o futuro se poderia ler no
passado, o longínquo se expressa no próximo. Poderíamos conhecer a beleza do
universo em cada alma se pudéssemos abrir todas as dobras, que só se
desenvolvem sensivelmente no tempo. Mas como cada percepção distinta da alma
compreende uma infinidade de percepções confusas que envolvem todo o universo,
a própria alma só conhece as coisas que pode perceber na medida em que possui
percepções distintas e destacadas e possui perfeição na medida em que possui
percepções distintas”.
(Leibniz.
Princípios da natureza e da graça
fundados em razão. 13).
A
razão da dobra, tal como Deleuze a utiliza, pressupõe uma exposição da
filosofia de Leibniz em que fica claro pelo menos os conceitos de expressão,
implicação, predicação, uno/múltiplo e decorrência analítica.
Para
Leibniz, as almas estão em toda parte, um conceito hermético, vinculado com a
dobra e seus correlatos.
O
filosofo dá o nome de mônada à alma, encontrando esse nome ente os
neoplatônicos, os quais se serviam dele para designar o estado Uno: a unidade
que envolve a multiplicidade que, por sua vez, desenvolve o dito Uno à maneira
de uma série.
Para
ele, o múltiplo não é o que tem muitas partes, mas o que é dobrado de muitas
maneiras.
A
mônada é exatamente o inverso de Deus.
Enquanto
a formula de Deus é o infinito dividido por um, a formula da mônada é um
dividido pelo infinito, diversas percepções de um mesmo objeto.
Cada
mônada expressa todo o mundo, no entanto comporta apenas uma parte.
Por
sua vez, cada alma está repleta de dobras ao infinito, contendo todo um mundo,
porém, um mundo constituído de dobras e redobras, que podem ser desdobradas em
pequeno número no interior dela própria, deixando transparecer uma zona
parcial.
Mas
o que é uma dobra afinal?
A dobra e a mônada.
As
dobras são pura virtualidade, pura potência, cujo ato consiste em hábitos ou
disposições na alma, cujo ato acaba consistindo em uma ação interior da alma.
Dobrar
e desdobrar não significa simplesmente tender e distender, contrair e dilatar,
mas sim evolver e desenvolver, involuir e evoluir.
Quanto,
por exemplo, um organismo morre, nem por isto é aniquilado, pois involui e
redobra-se no germe, que, por sua vez, desdobra-se em planta.
Simplificando,
poderíamos dizer que desdobrar é aumentar, crescer; dobrar é diminuir, reduzir.
A
dobra infinita separa ou passa entre matéria e a alma, a fachada e o
compartimento fechado, o exterior e o interior.
A
matéria-fachada vai para baixo, ao passo que a alma-câmara sobre.
A
dobra passa, portanto, entre dois andares.
Redobras
da matéria sob a condição de exterioridades, dobras na alma sob a condição de
clausura.
As
ideias estão de tal modo dobradas na alma que nem sempre é possível desenvolvê-las,
mesmo em Deus.
As
noções são de tal modo dobradas, que deixam míope o entendimento infinito.
As
forças derivativas da matéria remetem às forças primitivas, que são as da alma.
Cada
mônada expressa o mundo inteiro e cada sujeito-mônada só pode distinguir-se dos
demais por sua maneira interna de expressar o mundo.
É
o famoso princípio dos indiscerníveis, não há dois sujeitos semelhantes.
Do
mesmo modo não há duas mônadas semelhantes.
Cada
individuo só expressa claramente apenas uma parte do mundo real, expressa
claramente apenas a região determinada pelas suas singularidades constituintes,
embora possua todo o mundo em seu interior.
A alma.
A
alma é individual, porque circunscreve certo numero de singularidades que se
distinguem, embora sejam todas prolongáveis.
Para
Leibniz, a alma individualiza o corpo físico tomado na continuidade das espécies,
estas são individualizantes porque propriamente matemáticas.
Duas
figuras da mesma espécie são matematicamente um só e mesmo individuo.
Embora
todo indivíduo distinga-se de qualquer outro pelas suas singularidades
primitivas, nem por isto deixam de se prolongarem até as singularidades dos
outros, de acordo com uma ordem espaço-temporal que faz com que a parte visível
de um sujeito tenha continuidade na parte visível do próximo ou do seguinte, até
o infinito.
A
alma tira tudo de seu próprio fundo, faz seus próprios motivos, esses são
sempre subjetivos.
Partimos
sempre das pequenas inclinações que cada instante dobram nossa alma em todos os
sentidos sob a ação da inquietude.
É
o modelo do balanceiro, Unruhe, que
substitui a balança.
A
ação é voluntária quando a alma, em vez de sofrer o efeito das somas em que
entram solicitações, dá a si tal amplitude que a faz dobrar-se inteira.
O
ato voluntário é livre, porque ato livre é aquele que expressa toda alma em
certo momento da duração, é aquele que expressa o eu.
Concluindo.
A
inclinação é a dobra na alma, donde a formula de Leibniz está inclinada sem
estar necessitada.
O
motivo não é uma determinação, mas um inclinação; não é o efeito do passado,
mas a expressão do presente.
Determinado
fato estende-se no passado e no futuro, porque concerne inicialmente ao
presente vivo.
Minha
noção individual inclui o que faço neste momento, o que estou fazendo, tudo que
levou a fazer e tudo o que disso decorrerá, até o infinito.
De
modo que o presente está repleto do futuro e carregado do passado.
É
a situação do Deus leitor em Leibniz, que lê, em cada um, o que se faz em toda
parte e até mesmo o que se fez ou fará, que ê o futuro no passado, porque ele
pode desdobrar todas as redobras que só se desenvolvem sensivelmente com o
tempo.
Cada
mônada é tão somente uma passagem de Deus, tem um ponto de vista, este é o
resultado de uma leitura ou de um olhar, que passa por ela e com ela coincide.
A
mônada é livre porque sua ação é o resultado daquilo que passa por ela e se passa nela.
A
amplitude de uma alma racional é a região que ela expressa claramente, seu
presente vivo.
O
mundo só existe dobrado nas mônadas que expressam e que só desdobra-se virtualmente
como o horizonte comum de todas as mônadas.
Em
um sentido mais restrito, a mônada, quando chamada a viver, chamada à razão,
desdobra em si própria essa região do mundo que corresponde a sua zona inclusa
iluminada.
É
chamada a desenvolver todas as suas percepções, sendo esta sua tarefa.
Para saber mais sobre o assunto.
BELAVAL,
Y. Leibniz critique de Descartes. Paris:
Gallimard, 1960.
DELEUZE.
A dobra: Leibniz e o barroco. São
Paulo: Papirus, s.d.
LALANDE,
A. Vocabulário técnico e critico da
filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 1993.
MORA,
J. F. Dicionário de filosofia. Lisboa:
Dom Quixote, 1982.
Texto: Prof. Dr. Fábio Pestana
Ramos.
Doutor em História Social pela USP.
MBA em Gestão de Pessoas.
Bacharel e Licenciado em Filosofia
pela Universidade de São Paulo.
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Forte abraço.
Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos.
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