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domingo, 19 de julho de 2015

Esquerda e revolução socialista nas Américas (1950-1970).


Para entender a história... ISSN 2179-4111. Ano 6, Volume jul., Série 19/07, 2015.



Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos.

Doutor em história social - USP.
MBA em Gestão de Pessoas - UNIA.

Licenciado em história - CEUCLAR.
Licenciado em filosofia - FE/USP.
Bacharel em filosofia - FFLCH/USP.



Depois de um período de relativa docilidade em relação à liderança dos Estados Unidos da América, países latino-americanos registraram alguns movimentos de esquerda em uma época de turbulências e experimentações políticas.
A reação dos EUA conduziu a implantação de ditaduras de direita que se opuseram aos movimentos nacionalistas populistas ou de esquerda surgidos entre as elites locais.
Estes movimentos de esquerda adquiriram um viés anti-imperialista e antioligárquico, estimulado pelo triunfo da Revolução Cubana em 1959, com forte apelo revolucionário de caráter popular.
Foi o que aconteceu no México, na Guatemala, na Bolívia, chegaram a pelar para a revolução popular.
Por ocasião dos Jogos Olímpicos de 1968, no México, eclodiu um grande protesto de estudantes de cunho esquerdista na Universidade Nacional Autónoma do México (UNAM).
Diante da forte repressão do governo, o movimento se alastrou, 15 000 estudantes de várias universidades invadiram as ruas da cidade do México, ostentando cravos vermelhos como sinal de protesto contra a ocupação militar da UNAM, culminando com o chamado massacre de Massacre de Tlatelolco.
Na ocasião, milhares de estudantes e transeuntes foram detidos e pelos menos uma centena de pessoas atingidas por tiros foram mortas, incluindo crianças.
Pensadores da Educação: Antonio GramsciEste episódio deu origem, na década de 1970, a um movimento de esquerda no México orientado pelo pensamento de Gramsci, principalmente entre intelectuais que organizaram simpósios e palestras com a participação de pesquisadores vindos da Europa e também de gramscianos latino-americanos.
Dentro deste contexto, surgiu, a partir das Forças de Libertação Nacional (FLN) - fundada em 1969 -, o Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN), defendendo de direitos coletivos e individuais negados aos povos indígenas mexicanos, a construção de um novo modelo de nação que incluísse a democracia concreta e real, e, posteriormente, a liberdade e a justiça como princípios fundamentais de una nova forma de fazer política, colocando-se contra o neoliberalismo.
Na Guatemala, em 1954, quando o presidente eleito Jacobo Arbenz foi derrubado por um golpe articulado pelos EUA, através da CIA, sendo substituído pelo coronel Carlos Castillo Armas, ligado a grupos anticomunistas e a esquadrões da morte, iniciou-se uma luta intensa promovida por grupos de esquerda.
Carlos Castillo foi assassinado em 1957, sendo substituído pelo General Miguel Ydígoras Fuentes, que assumiu o poder em 1958.
Em 1960, um grupo de jovens oficiais militares armou uma revolta, que, no entanto, fracassou.
Na sequência, vários deles passaram à clandestinidade e estabeleceram estreitos laços com o governo de Cuba.

Forças Armadas Rebeldes – Guatemala | Almanaque dos Conflitos
Este grupo se converteu no núcleo das forças que organizaram a insurreição armada contra o governo que durante 36 anos, mergulhando o país em uma guerra civil.
Quatro principais grupos guerrilheiros de esquerda se articularam contra o governo de direita apoiado pelos EUA: o Exército Guerrilheiro dos Pobres, a Organização Revolucionária do Povo em Armas, as Forças Armadas Rebeldes e o Partido Guatemalteco do Trabalho.
Esses grupos fizeram uso de ações de sabotagem e ataques a instalações das forças de segurança governamentais.
Em 1982, os quatro grupos se uniram para formarem a Unidade Revolucionária Nacional Guatemalteca.
A guerra civil só acabou em 1996, quando guerrilheiros e o governo assinaram um cessar fogo e um pacto de anistia geral, ao passo que o país encontra-se em uma situação delicada até hoje.
Na Bolívia, a Guerra do Chaco, entre esta e o Paraguai, entre 1932 e 1935, foi o estopim da Revolução de 1952.
O conflito teve como pretexto o fato da Bolívia querer uma saída para o Atlântico, através do rio Paraguai.
Porém, a real motivação estava na disputa entre a petroleira Standard Oil, truste americano, e a Shell, anglo-holandesa.
Ambas com pretensões a controlar o petróleo do Charco Boreal, região petrolífera.
O resultado foi um grande derramamento de sangue, com quase 100 mil pessoas dos dois países irmãos mortas.
Em termos militares, Bolívia foi derrotada, suas forças armadas ficaram desgastadas junto à população boliviana.
Bolívia, como se faz e como se perde uma revolução proletária ...O que trouxe rebeldias dentro do exército e um setor militar voltado para o povo e o sentimento anti-imperialista, com cunho progressista de esquerda.
Em decorrência deste processo político de pós-guerra, surgiu o primeiro governo seguindo esta orientação, liderado pelo coronel Davi Toro, que logo expropriou os bens do truste norte-americano e nacionalizou o petróleo e o gás, fazendo surgir a estatal YPFB.
O segundo governo nacionalista de esquerda foi do general Gérman Busch que acabou se suicidando; devido à terrível pressão das oligarquias e de três famílias - Simón Patiño, Carlos Aramayo e Maurício Hoschild - que detinham o controle do estanho e de outros minérios.
Busch se tornou mártir, despertando a população para mudanças, estimulando o enfrentamento dos setores oligárquicos e o próprio imperialismo norte-americano.
Derrotados o setor nacionalista e o progressista militar, o povo boliviano continuou sob um quadro econômico e social de, praticamente, um mínimo de alteração em relação a décadas de exploração e miséria.
A quase totalidade da população, na sua absoluta maioria vivendo no campo, em condição de servidão, sob a brutal exploração de latifundiários, era formada por analfabetos sem direito ao voto, sem cidadania, em um momento em que para ter esse direito, ser reconhecida como cidadã, a pessoa tinha de ter alguma posse e acesso à escola.
Os índios, maioria absoluta da população, que no passado tinham terras para trabalhar e ganhar a vida, após perdê-las para latifundiários, viram-se obrigados a um regime de semiescravidão, trabalhando para uma minoria que os expropriou, a troco de quase nada.
A quase totalidade das terras cultivadas estava nas mãos de 6% da população rural; sendo que somente 2% das terras eram cultivadas.
A produção de alimentos, subordinada a uma estrutura de latifúndios, era extremamente precária, forçando o país a importar comestíveis, vendendo-os a preços insuportáveis para a grande maioria da população, elevando enormemente a inflação.
Como se bastasse, o controle dos minérios, como o estanho e outros, permanecia nas mãos das mesmas famílias oligárquicas de sempre.
As condições objetivas para revolta, inclusive para a revolução, estavam evidenciadas, principalmente entre o proletariado mineiro.
Foi quando, na década de 1940, surgiu o MNR (Movimento Nacionalista Revolucionário), partido de composição ideológica contraditória, pois dentro dele existiam, desde setores anti-imperialistas e socialistas, até nazifascistas, simpatizantes de Hitler e Mussolini, tendo prevalecido, no entanto, com o passar do tempo, os que tinham o propósito de derrotar as oligarquias e o imperialismo, para levar o país a ser dono de suas riquezas, buscando fazer as reformas necessárias, como a reforma agrária.
O seu líder maior era o intelectual Victor Paz Estenssoro, ao lado de Siles Suazo.
Estenssoro ganhou as eleições em 1952, mas não conseguiu tomar posse, devido a uma ação militar golpista.
O que levou o MNR a recorrer à luta, armando camponeses e mineiros, chegando ao poder pela revolução de cunho esquerdista.
No poder, levado pela pressão das massas revolucionárias, o governo do MNR logo destitui o exército, trocando-o por milícias populares armadas; decretou a reforma agrária; estabelece o direito de voto para todos os indígenas, que passam a poder votar pela primeira vez, ganhando juntamente com outros setores dos explorados a condição de cidadãos; criando a COB, instrumento nacional de luta do proletariado boliviano, tendo Juan Lechin como o seu líder e dirigente máximo, o qual integraria a composição do governo revolucionário. Medidas políticas irrefutavelmente relevantes.
Diferente do que procedeu em outros casos, os EUA apoiaram o governo do MNR, dando, inclusive, apoio financeiro, achando que o apoio a Estenssoro e Siles Suazo significava evitar que o poder caísse em mãos de comunistas ou de outras forças dispostas a mudanças radicais.
Buscava anular “o pior”. Indubitavelmente, essa manobra contribuiu para que o MNR fosse perdendo prestígio junto à massa popular que o apoiava, levando seus governantes, cada vez mais, para a direita, principalmente no segundo governo de Paz Estenssoro, derrubado, em 1964, por um golpe militar liderado pelo general Barrientos.
A política norte-americana na América Latina iria, a partir da década de 1960, instaurar ditaduras de direita para evitar o alastramento dos movimentos de esquerda, o que no Brasil culminou com o gole de 1964.

Para saber mais sobre o assunto.
LÖWY, Michael (Org.). O marxismo na América Latina: uma antologia de 1909 aos dias atuais. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2005.
PECEQUILO, Cristina Soreanu. A política externa dos Estados Unidos. Porto Alegre: UFRGS, 2005.



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Forte abraço.
Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos.

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