Para entender a história... ISSN 2179-4111.
Ano 8, Volume jul., Série 09/07, 2017.
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Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos.
Doutor em Ciências Humanas - USP.
MBA em Gestão de Pessoas - UNIA.
Licenciado em História - CEUCLAR.
Licenciado em Filosofia - FE/USP.
Bacharel em Filosofia - FFLCH/USP.
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1. Introdução.
Não por acaso,
as viagens de exploração terrestre, em busca do Prestes João, foram intensificadas
no século XIV, pois foi justamente por esta época que ascendeu ao poder a
dinastia de Avis; o que faltava para eliminar os últimos entraves à expansão ultramarina.
Depois de um
período conturbado; que envolveu três guerras com Castela, entre 1369 e 1382,
motivadas por disputas sucessórias ao trono espanhol ao qual candidatou-se o
monarca português e por questões políticas envolvendo a França e a Inglaterra;
o rei D. Fernando faleceu em 1383.
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Batalha de Aljubarrota em 14 de agosto de 1385. |
Deveria
sucedê-lo a Infanta D. Beatriz, porém, poucos meses antes ela havia casado com
o rei de Castela, por conta de um acordo que pôs fim a terceira guerra luso-castelhana.
Ocorre que as
cláusulas do acordo previam que o filho de D. Beatriz sucedesse seu pai e não
ela, o que deveria se dar quando este tivesse catorze anos, quando herdaria o
trono de Portugal; mas não a coroa de Castela, já que o monarca castelhano
tinha filhos de um casamento anterior, a quem recaia a primazia.
Por conta desta
situação, principalmente devido a conhecida cobiça castelhana sobre Portugal,
parte da nobreza e o restante da população não aceitaram a aclamação de D.
Beatriz como rainha.
Uma vez que esta
não tinha filhos e não havia sinal de que pudesse vir a ter algum em breve.
Assim,
desencadeou-se a Revolução de Avis, mais que uma simples rebelião, simbolizava
o rompimento com os resquícios medievais que atravancavam o comércio e a
expansão ultramarina.
Possibilitaria o
pioneirismo que garantiria ao país a primazia sobre exploração marítima e
conduziria a abertura da rota atlântica da Índia.
2. Fruto do amor de Pedro e Inês.
O infante D.
João era filho do caso de amor entre D. Pedro I e Dona Inês de Castro, esta
última assassinada por ordem do próprio pai de Pedro, por pertencer a uma
família galega, uma vez que se temia a influência da Galícia sobre o Estado
português quando este assumisse a Coroa.
O infante Pedro
de Portugal, herdeiro do trono, apaixonado, casou-se em segredo com a prima
Inês, uma nobre da Galícia, sem autorização do pai, o rei D. Afonso IV.
Depois de
viverem casados em segredo por alguns anos, já com 4 filhos (Afonso - 1346, que
morreu pouco depois de nascer -, João -1349 -, Dinis - 1354 - e Beatriz -
1347); o rei descobriu a união, anulou o casamento e fez o filho se casar com
outra mulher de sua escolha.
Mais tarde, quando
Pedro já parecia conformado e estava casado com a escolhida do pai; o rei
descobriu que o filho continuava se encontrando com Inês e que tinha uma família
com ela; mandou encontrar o esconderijo e assassinar Inês.
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O assassinato de Inês de Castro em 7 de janeiro de 1355. |
Pedro moveu uma
guerra contra o pai e tornou-se o novo rei, coroando a esposa falecida como
rainha e realizando a cerimônia de beija mão com o cadáver, obrigando todos os
nobres do reino a prestar juramento a rainha morta.
Os filhos com
Inês foram poupados da guerra entre pai e filho, porque eram considerados bastardos
aos olhos da justiça; sobreviveram e receberam, posteriormente, títulos da
baixa nobreza; cabendo a João a mercê de Mestre da Ordem Militar de São Bento de Avis.
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A coroação de Pedro I e o beija mão da rainha morta em 1361. |
No entanto, existe uma controvérsia quanto a maternidade de D. João, pois algumas fontes afirmam que o Mestre de Avis era
filho de D. Pedro com a filha de um comerciante, com quem se relacionou após a
morte de Dona Inês; e que o filho desta última era outro João, que teria
assassinado a esposa e falecido na prisão na Espanha.
Mas outras
fontes dizem que o Mestre era filho de Inês de Castro, por isto mesmo amado
pelo povo como o fora seu pai.
Uma terceira hipótese
levanta a possibilidade de que o Mestre não era filho de Inês, mas se
aproveitou da confusão reinante já na época para assumir esta posição, obtendo
apoio do povo miúdo para subiu ao trono após a morte do meio irmão, o rei D.
Fernando.
O fato é que,
filho de Inês ou de outra mulher, reconhecidamente ilegítimo de D. Pedro e meio
irmão do rei D. Fernando; D. João substituiu a dinastia de Borgonha pela de
Avis, através de uma Revolução da nobreza, apoiada pela maioria da população
lusitana, que durou de 1383 até 1385.
3. A Revolução de Avis.
Depois da morte
do rei D. Fernando, a nascente burguesia lusitana, em geral envolvida com os
intermediários italianos no comércio de especiarias, enxergava na regência de
D. Leonor Teles a continuidade da orientação política do reinado anterior.
Antes de morrer,
o rei insistia em manter uma taxação de cunho medieval, permitindo aos seus
vassalos também cobrassem seus próprios impostos, o que prejudicava os interesses
da burguesia, então já imensamente mesclado com a baixa nobreza em Portugal.
Ao mesmo tempo, a
alta nobreza presumia que a independência de Portugal estaria ameaçada, caso
Leonor não tivesse filhos.
Enquanto os
camponeses ansiavam que o filho de D. Pedro subisse ao trono, isto por ser o
dito D. Pedro muito popular entre a arraia miúda e por recair sobre ele toda
uma aura mítica.
A Revolução
começou em Lisboa, com o assassinato do conde de Andeiro por representantes da
burguesia.
O golpe foi apoiado
pelo povo miúdo, ao passo que o Mestre da Ordem militar de Avis, foi
aclamado rei D. João I.
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O túmulo de D. João I e Dona Filipa
no Mosteiro de Batalha.
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Nem todos
aceitaram pacificamente o golpe, a população ficou dividida e os castelhanos
chegaram a cercar Lisboa, forçando D. João I a fugir.
Foi buscar apoio
na Inglaterra, selando um tratado de amizade com aquele país por meio de seu
casamento com D. Filipa de Lancaster, filha de um duque que se tornaria rei da
dita Inglaterra.
Apesar de casados por conveniência, viveriam um grande caso de amor, como demonstra o simbolismo do túmulo do casal no Mosteiro da Batalha; onde se pode observar os dois de mãos dadas.
Após várias
batalhas travadas entre 1383 e 1385, o exército do rei de Castela, apoiado pela
cavalaria francesa, foi derrotado por tropas portuguesas e inglesas na batalha
de Aljubarrota em 14 de agosto de 1385.
A partir de
então, combates continuaram a ser travados até 1411, mas sob o comando de Nuno
Álvares Pereira, as tropas lusas estiveram sempre em vantagem, garantindo
definitivamente a independência de Portugal, ao menos até a União Ibérica em
1580.
4. Concluindo.
D. João I foi o
monarca que mais contribuiu para a centralização do poder político em Portugal,
que, embora já se encontrasse concentrado nas mãos do rei desde D. Afonso
Henriques, foi reforçado em torno da Coroa.
Um controle mais
rígido sobre a nobreza foi implementado, sobretudo, porque parte dela havia
tomado o partido castelhano em beneficio da manutenção da velha dinastia de
Borgonha.
Apesar de
medidas em favor dos camponeses, implantadas no início, que na prática acabaram
com a servidão em território português; a burguesia foi quem mais se
beneficiou.
A nova dinastia
incentivou o comércio, passou a construir um Estado mercantil desde então.
Muitos
mercadores foram agraciados com o título de cavaleiro, passando a compor uma
nova nobreza, vivamente interessada em atividades comerciais, que substituiu os
nobres que apoiaram os Borgonha na guerra.
Resolvida a
questão da independência portuguesa frente à Castela e renovada a nobreza,
diante da tradição marítima acumulada pela indústria da pesca, da geografia
favorável e da necessidade de buscar no mar o que o solo não podia suprir; sob
o governo de D. João I, a cruzada contra os infiéis foi retomada.
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D. João I, Mestre da Ordem Militar de Avis. |
Constituiu uma
forma de direcionar a belicosidade da velha nobreza, que estava enfraquecida,
mas ainda ativa; assim, afastando da tentação de remover do poder a dinastia de
Avis.
Simultaneamente,
foi aberto caminho aos mercadores que compunham a nova nobreza em formação para
expansão dos seus negócios, eliminando os italianos do comércio de especiarias
via Mediterrâneo, no qual já estavam envolvidos como intermediários, vendendo
produtos para o norte da Europa.
Os lusos voltaram
sua atenção para o norte da África, dando início a expansão ultramarina.
O próprio filho
do rei, o infante D. Henrique, foi encarregado de organizar a empreitada em
nome do Estado.
Apesar de vários
fatores terem estimulado e empurrado os portugueses em direção ao seu destino,
antes que a exploração da costa africana se tornasse possível, alguns obstáculos
tiveram que ser contornados.
Entre eles, o
imaginário popular, a falta de recursos financeiros e de voluntários dispostos
a rumar ao desconhecido e outras questões técnicas; mas estes são temas para
outras ocasiões.
5. Para saber mais sobre o assunto.
RAMOS, Fábio
Pestana. No tempo das especiarias.
São Paulo: Contexto, 2006.
RAMOS, Fábio
Pestana. O apogeu e declínio do clico das
especiarias: 1500-1700. Volume 1: Em busca de cristãos e especiarias. Santo
André: FPR/PEAH, 2012.
RAMOS, Fábio
Pestana. Por mares nunca dantes
navegados. São Paulo: Contexto, 2008.
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Forte abraço.
Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos.
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