Para entender a história... ISSN 2179-4111.
Ano 9, Volume jul., Série 02/07, 2018.
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Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos.
Líder do Projeto.
Doutor em Ciências Humanas - USP.
MBA em Gestão de Pessoas - UNIA.
Licenciado em História - CEUCLAR.
Licenciado em Filosofia - FE/USP.
Bacharel em Filosofia - FFLCH/USP.
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COAUTORES: Lucas
Henrique Alves de Freitas, Lucas da Silva Souza, Luiz Primo Ferreira Junior,
Rithielen Teixeira Canuto, Victor Antonio Araujo Santos (discentes do curso de
engenharia Civil do Centro Universitário Monte Serrat - Unimonte).
O texto deste artigo originalmente compunha uma
monografia inserida no Projeto Integrador, orientada pelo Prof. Dr. Fábio
Pestana Ramos, apresentada pelos alunos citados como coautores ao Centro
Universitário Monte Serrat (Unimonte), como exigência parcial para a aprovação
na disciplina PI II do curso de engenharia. Os resultados da pesquisa foram
apresentados ao público em evento interno da universidade, submetido à
avaliação de banca de professores do curso no ano de 2015. Este texto foi
atualizado pelo orientador, com modificações substanciais, para publicação na
Revista.
RESUMO: Os nove canais originais da cidade de Santos,
construídos entre 1905 e 1927, são a maior obra de engenharia na história da cidade.
Criados pelo engenheiro Saturnino de Brito, com o intuito de melhorar a
precária situação sanitária da cidade, que carecia de um sistema de esgoto e
escoamento das águas das chuvas, acarretando em diversas epidemias; as quais
estavam, gradativamente, avançando pelo interior do estado de São Paulo, o
principal porto de exportação da produção cafeeira do Brasil. A criação do
saneamento erradicou estas doenças da cidade, drenando as áreas alagadiças, ampliando
o espaço destinado a instalação de novas residências e deixando como legado um
monumento. O pretendemos investigar a origem destes canais, entendendo as
técnicas de construção e materiais empregados, ressaltando sua importância para
cidade e população. Contribuindo para o resgate e preservação da memória de
estruturas históricas do litoral paulista.
PALAVRAS-CHAVE: Canais, Santos, Saneamento
Básico, Saturnino de Brito.
ABSTRACT: The nine original canals in the city of
Santos, built between 1905 and 1927, are the greatest engineering work in the
city's history. Created by engineer Saturnino de Brito, in order to improve the
precarious sanitary situation in the city, which lacked a sewage system and
rainwater runoff, resulting in several epidemics; which were gradually
advancing through the interior of the state of São Paulo, the main export port
for coffee production in Brazil. The creation of sanitation eradicated these
diseases from the city, draining wetlands, expanding the space for the
installation of new homes and leaving a monument as a legacy. We intend to
investigate the origin of these channels, understanding the construction
techniques and materials used, emphasizing their importance for the city and
population. Contributing to the rescue and preservation of the memory of
historic structures on the coast of São Paulo.
KEYWORDS: Channels, Santos, Basic Sanitation,
Saturnino de Brito.
1. INTRODUÇÃO.
Desde que foi
fundada, em 1543, a cidade de Santos, localizada no atual Estado brasileiro de
São Paulo, passou por constantes alagamentos e problemas decorrentes da
ausência de um saneamento básico adequado.
No século XIX,
percebeu-se que era necessário investir na drenagem, implantando canais para
escoar a água.
Canais de
drenagem são rios artificiais que transportam as águas da chuva e do solo
encharcado.
Em geral, são
construídos com a finalidade de estabelecer um sistema sanitário e, na cidade
de Santos, foram idealizados para amenizar o surgimento de epidemias e,
consequentemente, reduzir o índice de mortalidade.
Através deste
sistema, seria possível drenar e locomover a água, contribuindo com o
escoamento dos esgotos e o controle de epidemias.
Projetados pelo
engenheiro Francisco Saturnino Rodrigues de Brito, simplesmente conhecido e
eternizado nos anais da história como Saturnino de Brito; os canais fizeram
parte de um projeto sanitário que pretendia instalar nove deles em conjunto com
um sistema de esgotos, separado e em paralelo; mas passaram a ser um ponto
turístico devido a sua vasta amplitude e estrutura arquitetônica com estética
inovadora.
Os sete
principais canais partem da orla da praia, transitando por toda a cidade, por
isto, transformaram-se em ponto de referência para a população.
Considerados
atualmente monumentos, que contaram com estudos de engenharia, arquitetura e
geográficos; os canais contribuíram para o desenvolvimento da cidade, tanto
econômico como social.
Depois de sua
instalação houve uma diminuição na taxa de mortalidade, devido doenças
relacionadas com a ausência de drenagem de água empossada; e rápido crescimento
populacional e da ocupação de espaços na cidade.
Outros benefícios
correlacionados resultaram na utilização da mão-de-obra que favoreceu a
economia local, ajudando na elaboração do sistema sanitário da cidade.
Na época de sua
construção, os canais geraram melhorias substancias na captação da água da
chuva, ajudando a solucionar o problema dos alagamentos; embora atualmente a
ampliação do volume de água, dado o crescimento populacional, não permita mais
isoladamente eliminar as enchentes que ainda persistem e incomodam a cidade.
Pretende-se aqui
estudar as estruturas usadas na época da construção original dos nove canais de
Saturnino de Brito, sua importância para a cidade e população, elaborando uma
maquete simbolizando um trecho de um dos canais.
Ressaltamos que
este estudo insere-se em um projeto mais amplo, desenvolvido no ano de 2014 e
2015, idealizado e liderado pelo Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos, docente titular
da Unimonte no curso de engenharia civil; de conservação da memória de
estruturas históricas da cidade de Santos e dos processos de construção civil
do passado.
Assim,
abordaremos dados, recuperando a história dos canais desde sua criação até
alcançar a contemporânea importância cultural e arquitetônica para a cidade e
população.
Mostraremos as técnicas
de construções e materiais utilizados que permitiram a inauguração dos canais,
conservando a memória em forma de maquete.
Para alcançar
este objetivo, realizamos pesquisa de campo em locais que ajudaram a conhecer
os materiais, processo e funcionamento dos canais; além de investigação
documental e bibliografia.
Atualmente, os canais
de Santos possuem mais de cem anos, sendo uma das características da cidade e
pela qual é reconhecida, um ponto de referência.
O desenvolvimento
da maquete, além de preservar a memória, trazendo uma visão mais ampla sobre
sua estrutura, funcionalidade e marcante presença na cidade; pretende fomentar
a discussão sobre o futuro dos canais e possíveis novas aplicações.
A água captada
pelos canais, por exemplo, poderia ser tratada e, posteriormente, utilizada
para o consumo da população; resolvendo a questão das enchentes que assolam a
cidade em épocas de chuva mais intensa.
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Maquete simbolizando um trecho de um dos canais de Santos, confeccionada pelos coautores do artigo. Fonte: Foto do autor. |
2. OBJETIVO.
Através do
Projeto Integrador, realizado pelos alunos do segundo semestre de 2015, do
curso de Engenharia Civil da Unimonte, orientados pelo Prof. Dr. Fábio Pestana
Ramos; pretende-se estudar as técnicas de construção utilizadas na época,
mostrando a grande importância dos canais para a cidade de Santos e sua
população e, resgatando suas primeiras formas, imortaliza-las em maquete.
Para iniciar a
confecção da maquete, tornou-se necessário pesquisar as técnicas de construção
e o contexto de sua utilização.
Através do
estudo das fontes disponíveis e pesquisa bibliográfica, realizamos a construção
da maquete simbolizando um trecho de um dos canais de Santos, conforme sua aparência
original quando foi construído, antes do crescimento vertical e horizontal da
cidade ao longo da segunda metade do século XX.
Assim,
pretendemos resgatar a memória de um marco nas estruturas arquitetônicas
históricas presentes na cidade.
O objetivo deste
estudo é entender a construção dos canais, assim como as técnicas empregadas, realizando
uma análise crítica de sua criação e dos materiais utilizados originalmente.
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Maquete simbolizando um trecho de um dos canais de Santos, confeccionada pelos coautores do artigo. Fonte: Foto do autor. |
3. PROBLEMÁTICA.
Antes da
construção dos canais, Santos era repleta de problemas epidêmicos e de
salubridade, responsáveis pela transmissão de doenças e um constante estado de alagamento
das ruas, prejudicando o crescimento da cidade e da população.
As chuvas
inundavam facilmente as ruas entre a praia e o centro antigo, situado então um
pouco abaixo do nível do mar, facilitando o acúmulo de água e dificultando o
escoamento.
Junto com as
cheias, a água empossada virava um criadouro de mosquitos, fazendo a população
sofrer com várias epidemias como a febre amarela e dengue, dentre outras que
seriam descobertas pela ciência posteriormente como zika e chikungunya,
ameaçando a população e prejudicava o turismo.
No inicio do
século XX, a população estimada da cidade rondava 50.000 habitantes; uma década
antes, entre 1890 e 1900, morreram 22.588 pessoas vítimas de epidemias,
correspondendo a 50% dos habitantes.
Somente no ano
de 1901, 6.683 pessoas faleceram vitimas da febre amarela.
A falta de uma
rede de esgotos e abastecimento de água potável estava na origem da mortandade,
trazendo medo e inúmeros problemas para o cotidiano dos santistas.
A construção dos
canais sanou uma parte destes problemas, razão pela qual entender e preservar
sua memória, desde sua construção até os dias atuais, é importante para a
cidade e a história do Brasil.
Ocorre que os
canais não despertaram ainda a atenção dos historiadores profissionais, sendo
alvo de estudos que em muitos casos carecem de fundamentação documental, motivo
pelo qual sua história não é conhecida por grande parcela da população da
cidade de Santos.
Para dar conta
desta problemática, pensamos em confeccionar uma maquete que despertasse o
interesse para os canais, a qual finalizada foi doada ao Instituto Histórico e Geográfico
de Santos, visando à exposição junto com maquetes de outras estruturas
históricas da cidade.
Assim, atendendo
a intenção maior de inserção no projeto “A evolução histórica-estrutural da
cidade de Santos e região: um olhar da engenharia civil sobre o passado,
pensando em um futuro sustentável”.
A ideia,
portanto, é resolver o problema da ausência de uma memória da estruturação dos
canais de Santos, agregando informações que possibilitaram a confecção de uma
maquete, para compor o acervo permanente da Fundação Arquivo e Memória de
Santos, com finalidade educativa.
Discentes do
curso de engenharia civil contribuem com conhecimentos de sua área de formação,
orientados por um historiador, para entender os processos construtivos e
preservar a sua memória.
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Apresentação da Maquete simbolizando um trecho de um dos canais de Santos, confeccionada pelos coautores do artigo; à banca examinadora em evento interno na Unimonte. Fonte: Foto do autor. |
4. REFERENCIAL TEÓRICO.
Nascido em
Campos, no Rio de Janeiro, em 1864, Francisco Saturnino Rodrigues de Brito era
engenheiro sanitarista, fez os principais estudos urbanistas e de saneamento de
grandes cidades brasileiras.
Deixou vasta
obra e usou técnicas modernas de construção que já tinham sido usadas na
França, Inglaterra e Estados Unidos.
Por volta do ano
de 1890, houve grande elevação no número de mortes registradas na cidade de
Santos, dentre as causas oficialmente registradas desses óbitos estavam varíola,
peste bubônica, disenteria, febre tifoide entre outras.
“Santos até essa época continuava vitima
das epidemias periódicas, que além de prejuízos imediatos, desmoralizavam o
estado no estrangeiro. As obras do cais iniciaram o Saneamento em grande
escala. Sendo a ação municipal impotente, o governo estadual, interveio no
serviço de esgoto, que teve seu período decisivo de 1905 a 1912, com projeto e
execução de Saturnino de Brito. O plano incluía algumas medidas urbanísticas,
que sofreram varias modificações após discussões muito brasileiras com a
municipalidade e outros interessados.” (MAIA, 1950: 37-38)
O Engenheiro
Saturnino de Brito ficou encarregado de algumas obras na cidade, com destaque
para os canais de drenagem.
A primeira
inauguração foi do canal 1, em agosto de 1907, primeiro passo de um grandioso
plano de construção de canais pela cidade, projeto no qual o Brasil foi
pioneiro.
Na ocasião o
projeto foi pensado de forma a criar duas redes separadas: uma para escoar as
águas pluviais e outra para os esgotos.
Para entender o
desenvolvimento deste empreendimento, fez-se necessário buscar embasamento
recuperando o plano de ação original dos canais.
O trabalho foi
desenvolvido através de pesquisa de campo, com a visitação ao memorial do
construtor Saturnino de Brito, além de investigação documental e bibliográfica.
Pesquisamos
artigos acadêmicos e livros, que permitiram a análise de materiais e estruturas
empregadas nos canais, auxiliando na confecção da maquete.
O trabalho foi
dividido em cinco etapas:
1. Estudo dos
canais e a sua importância para a população de Santos.
2. Investigação
dos métodos construtivos da época e os materiais utilizados.
3. Análise das
ligações do canal até as casas dos moradores da cidade e do descarte dessa
coleta de esgoto, além da visualização da importância do transporte fluvial utilizando
os canais.
4. Retratação,
em forma de maquete, de um dos canais mais importantes na primeira metade do
século XX.
5. Análise dos
resultados da pesquisa e comparação dos canais na época de sua construção com
sua função atual.
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Coautores do artigo em evento interno da Unimonte, onde a Maquete simbolizando um trecho de um dos canais de Santos foi apresentada à banca examinadora. Fonte: Foto do autor. |
5. ANÁLISE DOS DADOS E RESULTADOS.
O projeto dos
canais da cidade de Santos obteve sucesso desde o início; logo o problema da cidade
estava resolvido, mostrando-se uma estrutura duradoura, tanto que o monumento
está em atividade até os dias de hoje, necessitando apenas de reparos ou restauro
ao logo de quase cem anos, sem nunca precisar de reconstrução.
Para confecção da
maquete utilizamos uma das plantas publicadas na obra Álbum Canais de Drenagem Superficial de Saturnino de Brito; a qual
fornece uma visão ampla da cidade, com os canais de drenagem destacados.
Em um primeiro
momento, decidimos fazer a maquete retratando todo o caminho de todos os
canais.
Todavia, quanto
maior a área retratada, menores seus detalhes, assim, decidimos focar apenas em
uma parte de um canal, para que pudesse ser mais realista em detalhes.
Elaboramos uma
planta da parte do canal que queríamos focar, a ideia inicial era fazer uma
base elevada, para mostrar como funcionava a encanação na parte do solo, estes
revestidos de PVC transparente.
Porém, quando
estudado mais a fundo, notou-se que não era algo vantajoso, visto que não tinha
nada a ser mostrado.
No solo eram
apenas os canos revestidos de concreto e terra ao redor.
Mais uma vez a
confecção teve de ser alterada, abandonando a base elevada, decidimos enfatizar
detalhes das ruas e do canal na parte superior.
Utilizando um
pedaço de um dos canais, fizemos outra planta e novo planejamento.
A maquete possui
1m de largura e 60cm comprimento, a escala utilizada foi de 1:50, onde cada 1cm
da maquete equivale a 50cm do real.
Os materiais
foram selecionados de acordo com as peculiaridades dos materiais aplicados na
estrutura original, de modo a criar a ilusão de observar a estrutura original.
Para isto,
decidimos utilizar: placas MDF, placas de isopor, papel ondulado, tinta
acrílica, tesoura, cola quente, gesso, cano PDV, cola de madeira e cola para isopor.
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Exposição da Maquete simbolizando um trecho de um dos canais de Santos, confeccionada pelos coautores do artigo; em evento interno na Unimonte. Fonte: Foto do autor. |
6. RESULTADOS DA PESQUISA.
Os canais de
Santos foram um marco na historia da cidade e na carreira do engenheiro
sanitarista Francisco Saturnino Rodrigues de Brito, representaram uma evolução
para a cidade e país, além de uma solução para o saneamento da época.
Cada um dos
canais possui características particularizadas para um melhor funcionamento, de
acordo com o terreno em que foi construído.
Buscamos
compreender o tipo de estrutura, materiais e técnicas utilizadas para
desenvolver a maquete, retratando o monumento na proposta original dos canais
santistas.
Houve
necessidade de conhecer o processo de construção e de planejamento, para saber
como os canais de drenagem e funcionavam e sua relação com as galerias pluviais
e de esgotos.
Fundada em 1543,
a cidade de Santos nasceu em torno do porto, localizado em um espaço favorecido
pela geografia, uma península com o mar de um lado e do outro o canal de
Bertioga formado por uma série de rios e ilhas.
Ganhando maior
importância durante o ciclo do ouro no século XVIII, quando ajudava a escoar a
produção das Minas Gerais junto com o porto do Rio de Janeiro, recebendo
produtos que abasteciam esta mesma região e servindo também como base para
contrabandistas que tentavam fugir do pagamento de impostos à Coroa.
No entanto, a
cidade cresceu somente com a expansão cafeeira do final do período Imperial no
século XIX, quando passou a escoar a produção que vinha de trem do interior do
Estado de São Paulo.
Depois da
abolição da escravidão, em 1889, houve um novo surto de crescimento
populacional com a efervescência do fluxo de mercadorias e pessoas, pois na
ocasião o Brasil passou a importar mão de obra europeia e, depois, japonesa.
Na época,
enquanto a cidade crescia em um ritmo rápido e desordenado, a situação da
cidade era precária, com ruas de terra quase sempre enlameadas, construções com
piso de madeira em constante estado de umidade e a ausência de um sistema de
esgotos e de escoamento da água da chuva.
O porto não
passava de uma série de trapiches de madeira, o que piorava a situação.
Os navios que
passavam por lá eram sujos, com porões repletos de ratos, trazendo além de
cargas, marinheiros e passageiros do mundo inteiro.
Estes traziam
consigo doenças contagiosas, que se espalhavam rapidamente entre a população
local, resultando em constantes surtos epidêmicos de grandes proporções e
enorme mortalidade.
A área onde era
possível construir casas era bastante restrita, porque havia extensos pântanos
e manguezais, a população estava aumentando e não havia espaço para instar os
novos moradores, que eram obrigados a morar em palafitas em condições de saúde
e higiene ainda mais precárias.
No final do
século XIX, a cidade estava assim configurada, quando passou por uma crise
sanitária grave.
Infestações
contagiosas transmitidas por mosquitos, que proliferavam nos pântanos e ruas
alagadas, somavam-se a sujeira, lixo, fezes de animais e ao clima quente e
úmido; além das doenças trazidas a bordo dos navios que aportavam em Santos.
Estas condições contribuíam
para que doenças se espalhassem com grande velocidade, tornando a região
insalubre, passando a ser evitada por nacionais e estrangeiros.
Na época, o
cônsul da Inglaterra no Brasil, Richard Burroughs, chegou a afirmar que Santos era
“uma cidade terrível, que arfa de calor como uma caldeira, pestilenta e doentia".
Metade da
população chegou a adoecer, acarretando em mortes e fuga maciça da população
urbana, principalmente daqueles que tinham condições e oportunidades de mudar
de cidade ou para zonas rurais mais afastadas do centro urbano.
Mesmo diante de
condições tão precárias, a proximidade com o mar atraiu o interesse de
empreendedores paulistas, que pretendiam instalar um balneário turístico, os quais
começaram a pressionar o governo da então província para realizar a drenagem
dos pântanos e áreas alagadas.
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O porto de Santos no século XIX. Fonte: Acervo Novo Milênio. |
A solução só
começou a ganhar forma depois da proclamação da República, quando o governo de
São Paulo decidiu financiar um empreendimento para solucionar a questão.
O que aconteceu depois
da intervenção, a favor do projeto, de Vicente Augusto de Carvalho; político e
fazendeiro envolvido com a produção de café, natural de Santos, que na altura
era juiz na capital paulista.
Em 1895,
criou-se a Comissão de Defesa Sanitária de Santos, que desenvolveu um plano
para resolver o problema considerado caro e extenso.
Somente dez anos
depois esta intenção ganhou um formato reconhecível, quando Vicente Augusto de
Carvalho tornou-se secretário municipal de obras da cidade.
Foi quando o
poder público contratou o engenheiro sanitarista Francisco Saturnino de Brito e
o engenheiro civil Miguel Presgrave para projetar um sistema de coleta de
esgoto, livrando as ruas das fossas a céu aberto.
O plano de
construção de canais de Saturnino de Brito passou a enfrentar a resistência de interesses
políticos e econômicos, gerando longo embate entre o engenheiro e a Câmara
Municipal.
Razão pela qual,
entre 1900 e 1903, os esgotos começaram a ser implantados para resolver a
situação da cidade, mas não um sistema de drenagem das águas de chuva que
continuava empossada.
Provisoriamente
foram construídos canais de drenagem de madeira como medida paliativa, sem
grande efeito prático, já que a insalubridade só séria resolvida com a
conclusão da proposta dos nove canais de Saturnino de Brito.
O projeto dos
canais não foi criado para jogar o esgoto da cidade no mar, mas para drenar a água
do solo encharcado.
Saturnino de
Brito buscou na França e na Inglaterra as técnicas para construir sua obra.
Anos antes, ele
havia vivido na Europa, tinha estudado na França, onde observou o surgimento de
inovações tecnológicas e soluções simples para o problema do saneamento básico.
Importou a ideia
do uso do concreto ao invés da madeira, o que, depois, exigiu e fomentou a
criação de indústrias que pudessem produzir os equipamentos e materiais necessários.
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Planta da Comissão de Saneamento de 1910. Fonte: Imagem publicada na obra da Comissão de Saneamento de Santos. |
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Distritos de Elevação Auto-Elétrica dos Esgotos de Santos. Fonte: Imagem publicada na obra da Comissão de Saneamento de Santos. |
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As instalações da Estação 2. Fonte: Imagem publicada na obra da Comissão de Saneamento de Santos. |
O primeiro
registro do uso de concreto no mundo remonta ao ano de 1756, quando o
engenheiro civil inglês John Smeaton misturou agregado graúdo e cimento; em
1793, construiu na Inglaterra um farol, o Eddystone Lighthouse, com o uso de
cimento hidráulico.
Depois, outro
grande desenvolvimento aconteceu no ano 1824, o inventor inglês Joseph Aspdin
desenvolveu o cimento portlant, fabricando concreto queimando giz com terra e
argila, em um forno até que o dióxido de carbono evaporasse, resultando em um
forte cimento.
Em 1816, na
Alemanha, aconteceu o primeiro teste sistemático de concreto, aperfeiçoado por
um jardineiro francês chamado Joseph Monier, que inventou o primeiro concreto
armado em 1849.
Portanto, o uso
do concreto já estava difundido na Europa quando Saturnino de Brito resolveu
implantá-lo no Brasil.
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Obras do Canal 1, as quais contaram com guindastes de uma pequena ferrovia construída exclusivamente para o transporte de pedra e terra. Fonte: Acervo Novo Milênio. |
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Construção do canal 1 em 1906. Fonte: Acervo Novo Milênio. |
Assim, com tudo
planejado, após vencer o embate com o poder público municipal, contando com o
apoio do governo do Estado de São Paulo; a construção dos canais foi autorizada
em 1905.
Em simultâneo
com a finalização dos planos de construção destes canais, urgentes para escoar
a água das chuvas; Saturnino de Brito precisou lidar com a gravidade para
concluir a rede de esgotos, uma vez que a cidade era plana, não permitindo a
vasão da água como acontecia em outras cidades de forma natural.
Todo o esgoto
coletado precisou convergir para uma única tubulação, onde, através de três
bombas seria remetido a uma Estação Elevatória, de onde para completar a última
etapa do processo, o esgoto seria lançamento no mar.
Saturnino
desejava que o esgoto fosse lançado o mais longe possível para não poluir as
águas usadas pela população para banho em balneário.
Para isto, já
imaginando um crescimento futuro da área urbana e estudando a movimentação das
marés, decidiu que este ponto de lançamento deveria ser localizado em um morro.
Mais
especificamente na Ponta do Itaipu, entre São Vicente e Praia Grande, em uma
área então imprópria para habitações devido ao terreno, hoje um parque
estadual, de onde o esgoto lançado não voltaria para as praias dado a regime de
marés.
Entretanto, havia
um problema significativo, porque este local estava fora da península; sendo
necessário, levar o esgoto por uma série de tubulações por cima do mar até o
continente.
O que demandava
a construção de uma ponte, originando a famosa e centenária Ponte Pênsil, que
se tornaria um dos cartões postais da cidade de São Vicente.
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Terminal, oficina e usina de prevenção. Fonte: Imagem publicada na obra da Comissão de Saneamento de Santos. |
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Emissários de descarga no mar. Fonte: Imagem publicada na obra da Comissão de Saneamento de Santos. |
6.1. LOCALIZAÇÃO
E FINALIDADE.
Ao todo, foram planejados
nove canais pelo engenheiro Saturnino de Brito, concluídos ao longo de vinte
anos.
As obras foram
iniciadas em 1906, com canais projetados para serem enormes valas de concreto
destinadas à condução das águas, traçados em um eixo meridional na península.
O traçado dos
canais foi pensado para, ao sul, as águas serem escoadas para o oceano e, ao
norte, para o canal do estuário, que separa a ilha de São Vicente da ilha de
Santo Amaro e do continente.
Haveria também
um sistema de comportas para que, em dias de chuva, os canais fossem cheios e a
água liberada gradualmente para não causar a destruição das praias.
A função destas
comportas era também evitar que na maré cheia a água do mar invadisse a cidade,
permitia que fossem abertas em emergências, ajudando na vazão das águas para a
praia e evitando enchentes no centro da cidade.
Curiosamente, com
o crescimento de Santos, este sistema se tornou falho; atualmente a necessidade
de fechamento das comportas na maré cheia, quando coincide com chuvas intensas,
provoca justamente o alagamento da cidade em vários pontos.
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Mapa dos canais idealizados por Saturnino Brito. Fonte: Imagem publicada na obra da Comissão de Saneamento de Santos. |
O primeiro canal
finalizado foi o 1, que demorou dois anos para ser concluído em 1907,
localizado atualmente na Avenida Pinheiro Machado, o mais próximo da divisa com
São Vicente e que fica nas proximidades do Teatro Municipal e, chegando à
praia, nos arredores do Orquidário e do Emissário Submarino.
O mais longo de
todos os canais, que se inicia na praia, nas proximidades da Estação Elevatória
de Esgoto, no bairro do José Menino, e percorre os bairros de Marapé, Vila
Mathias e Vila Nova até desaguar na frente do Mercado Municipal.
Para além da sua
função prática de sanear a cidade, Saturnino de Brito pensou os canais para
serem rodeados de avenidas largas, completando um ideal de embelezamento
urbanístico.
O canal 1 foi
projetado para ser totalmente navegado, deveria servir ao trânsito de pequenos
barcos, por isto seu trajeto passando pela chamada Bacia do Mercado, permitindo deslocar peixes e frutas até o Mercado
Municipal por via fluvial.
O fluxo contínuo
de água, independente do volume de chuvas, estava garantido pelo Ribeirão dos
Soldados, um pequeno riacho estreito, que dependendo da época do ano corria
sentido praia ou sentido centro, deixando para trás uma enorme área insalubre.
Assim, servindo
de piloto para nortear a construção dos demais, a inauguração do canal 1
transformou-se em um grande acontecimento no dia 27 de agosto de 1907, cercado
de pompa e festejos.
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A inauguração do canal 1, com a presença do presidente de São Paulo, Jorge Tibiriçá, e do engenheiro Saturnino de Brito de chapéu panamá na frente do barco, saudado pela eufórica população. Fonte: Acervo Novo Milênio. |
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O deslocamento de mercadorias pelo canal 1 no dia de sua inauguração em 27 de agosto de 1907. Fonte: Acervo Novo Milênio. |
O projeto de Saturnino
de Brito não envolvia somente os canais e galerias de esgoto, estava previsto
diversos modelos de pontes, muitas delas em concreto armado, com escadarias de
acesso aos barcos.
Antecipando a
questão ambiental e urbanística, após a conclusão do canal 1, iniciou o
alargamento das ruas em seu entorno, que se tornaram avenidas, ao mesmo tempo
em que árvores foram plantadas ao longo de todo trajeto.
As árvores eram
de todas de copa grande, para ajudar na absorção de água, impedir que a terra
cedesse para dentro do canal e fornecer sombra; ajudando a diminuir as
temperaturas elevadas para os habitantes da cidade e, principalmente, para as peças
em concreto, evitando à dilatação do material.
Embora sua
construção tenha se iniciado em simultâneo com o canal 1, tomando como
parâmetro este e as melhorias ao seu redor; somente dois anos depois, em 1910,
foi inaugurado o canal 2 da Avenida Bernardino de Campos.
Hoje próximo ao
Mendes Convention Center, ao Gonzaga e, também, a Vila Belmiro, Estádio do
Santos Futebol Clube.
Um ano depois,
em 1911, ficaram prontos mais dois canais menores que estavam
interligados e saíam
do canal 1, em direção ao morro, que Saturnino de Brito chamou de canaletes, pelos quais não era possível
navegar.
Sendo um ao lado
da Estação Elevatória no José Menino, o canal 9 da Avenida Barão de Penedo, destinado
a receber as águas do Córrego Cachoeirinha; e outro, o canal 7 da Avenida
Francisco Manoel, ao lado da Santa Casa, destinado a drenar o atual bairro do
Jabaquara, hoje nomeado como canal 10.
No mesmo ano,
inaugurou-se o canal 4 da Avenida Siqueira Campos, com profundidade e largura
suficiente para receber navegação, criando a Bacia do Macuco, uma espécie de estacionamento para barcos que
transitavam pelos canais.
Em termos de
transporte fluvial, sua função era levar doentes em pequenos barcos, que
chegavam dos navios ancorados no porto de Santos, direto para o hospital Guilherme
Álvaro, sem ter que passar por dentro da cidade, impedindo a transmissão de
doenças para a população local.
O que estimulou
a instalação dos principais hospitais da cidade no seu em torno, até hoje
localizados no trajeto do canal.
Curiosamente,
projetado para evitar o trânsito pelos locais mais habitados da cidade,
atualmente o canal 4 fica no meio da cidade, próximo ao Super Centro Boqueirão
e a Avenida Conselheiro Nébias; onde estão, além dos principais hospitais,
escritórios e universidades da região e a Pinacoteca Benedito Calixto;
Após um ano da
conclusão dos três novos canais, em 1912, foi entregue o canal 8, localizado
naquela altura na rua Marapé, atual Avenida Moura Ribeiro.
Seguiu-se um
intervalo de cinco anos, provavelmente tributário do esgotamento de recursos
financeiros e devido a entraves burocráticos, quando o canal 6 foi finalizado
em 1917, hoje na Avenida Joaquim Montenegro.
Novamente depois
de um intervalo de cinco anos, em 1923 o canal 3 foi finalizado na Avenida Washington
Luís.
O último dos
nove canais planejados originalmente foi entregue somente em 1927, também com
um intervalo de cinco anos, trata-se do canal 5 da Avenida Almirante Cochrane.
Posteriormente, conforme
a cidade cresceu, inclusive por conta do processo de saneamento facultado pelos
nove canais projetados por Saturnino de Brito; a Prefeitura da cidade construiu
outros canais, todos na zona noroeste, que na época do projeto original estava
desabitada.
No final da
década de 1960 foram construídos mais seis canais, o canal 10 inaugurado em
1968, que atualmente é conhecido erroneamente pela população como 7, localizado
na Avenida General San Martin, foi o primeiro desta nova empreitada.
Depois foram
concluídos o canal 11, que fica entre o 6 e o Porto, na continuação da Avenida
Afonso Pena; e o canal 12, próximo ao Rádio Clube na Avenida Hugo Maia.
E entregues o
canal 13, na Avenida Alberto de Carvalho e Avenida Roberto de Molina; o canal
14, da Avenida Eleonor Roosevelt; e o canal 15, passando pela Avenida Jovino de
Melo.
No entanto, o
projeto de Saturnino de Brito se manteve inalterado, não exigindo reformas até
hoje, passando apenas por um único restauro em 2007, constituindo a base para a
rede de esgotos e águas pluviais da cidade.
Este sistema foi
apenas complementado na década de 1970, com a inauguração de um novo emissário
submarino.
Os canais de Saturnino
de Brito foram tombados, em 2006, pelo Conselho de Defesa do Patrimônio
Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo
(Condephaat) e; em 2007, pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de
Santos; passando para a administração da Companhia de Saneamento Básico do
Estado de São Paulo (Sabesp), atual operadora do sistema.
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O canal 1 no dia de sua inauguração, onde se pode observar as escadarias de acesso aos barcos. Fonte: Acervo digital do jornal A Tribuna. |
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A fila de populares para embarcar em barco de passeio no canal 1, em 1907. Fonte: Projetos e Relatórios - Saneamento de Santos (volume VII das Obras Completas de Saturnino de Brito, Imprensa Nacional/Instituto Nacional do Livro, Rio de Janeiro, 1943). |
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Ponte sobre o canal 1, sendo cruzada por Saturnino de Brito no dia da inauguração. Fonte: Acervo do Arquivo Público do Estado de São Paulo. |
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O canal 1 em 1914. Fonte: Acervo Novo Milênio. |
6.2.
CONTEXTUALIZAÇÃO.
A instalação do
regime republicano no Brasil, em 1889, tornou crescente economia capitalista,
articulando interesses econômicos de parte da elite brasileira com a
intensificação da força de trabalho assalariada, acelerando a importação de
mão-de-obra europeia.
A chegada de
cada vez mais navios ao porto de Santos, fez a cidade crescer rápido; a população
que ronda 5.000 habitantes no inicio do século XIX, havia dobrado em 1890,
contando com 13.000 pessoas.
O crescimento da
cidade acompanhou a expansão de São Paulo, a qual movida pelo café expandiu a
população de 20.000 habitantes em 1810 para 40.000 em 1890, depois atingindo a
cifra de 240.000 no inicio do século XX.
O surgimento de
uma infraestrutura de transporte baseada na instalação de ferrovias pelos
ingleses, permitindo chegar a capital em poucas horas; tornou possível um
crescimento até então sem precedentes da cidade de Santos.
A população
chegou a 50.000 habitantes antes do inicio do século XX, representando um
crescimento de 287%, justamente o momento em que a mortalidade atingiu metade
deste contingente.
Milhares de imigrantes
europeus, trazidos para o trabalho nas lavouras de café, muitos dos quais de
passagem pela cidade, além de migrantes nordestinos e escravos libertos,
optaram por fixar moradia em Santos, buscando oportunidades de trabalho na
crescente economia urbana.
Como já
ressaltado, no entanto, a cidade permanecia insalubre, repleta de lugares
impróprios à ocupação e sem obras de saneamento.
O final do século
XIX foi marcado por diversas epidemias de doenças transmissíveis, dizimando boa
parte da população e, em muitas ocasiões, impedindo o funcionamento do porto de
Santos, então o principal exportador do café brasileiro.
Visando
melhorias, o engenheiro Saturnino Brito, que já vinha estudando a situação de
Santos desde 1898, propôs um novo projeto, denominado Planta de Santos.
Este foi
apresentado à Câmara Municipal da cidade, por iniciativa do próprio Saturnino.
A proposta
exigia a aprovação de leis urbanísticas, anexas ao plano, contrárias aos
interesses econômicos de alguns promotores imobiliários, que se opuseram ao
plano de Saturnino de Brito.
Foram registrados
vários embates entre o engenheiro sanitarista e a municipalidade, culminando
com a sua demissão da Comissão de Saneamento e na rejeição parcial do projeto.
Desta forma, a
entrada do século XX foi marcada pelo impasse entre discurso e prática, pelo
conflito de interesses na atividade de planejamento urbano, que perdurou por
alguns anos.
Quando o projeto
de Saturnino finalmente foi aprovado, em 1905, ele assumiu a condução dos serviços
de saneamento com um plano geral para a cidade.
As obras ganham
ritmo acelerado e gradativamente possibilitaram o desenvolvimento de Santos, com
um projeto que respeitava a topografia e hidrologia, evitando o desperdício com
gastos e obras desnecessárias.
A conclusão do
projeto possibilitaria uma qualidade de vida inigualavelmente melhor do que aquela
que a população vivenciará no final do século XIX.
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Exposição da Maquete simbolizando um trecho de um dos canais de Santos, confeccionada pelos coautores do artigo; em evento interno na Unimonte. Fonte: Foto do autor. |
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Exposição da Maquete simbolizando um trecho de um dos canais de Santos, confeccionada pelos coautores do artigo; em evento interno na Unimonte. Fonte: Foto do autor. |
6.3. HISTÓRICO
DA CONSTRUÇÃO.
O engenheiro
responsável pela implantação do projeto dos canais, Francisco Saturnino
Rodrigues de Brito, apresentou um plano de saneamento para Santos que adotava
um sistema de separação absoluta entre a água drenada e o esgoto.
Ao mesmo tempo,
propôs um sistema de abastecimento de água que permitiria uma expansão
constante, acompanhado de propostas de planos urbanísticos baseados no
princípio de higiene e embelezamento da cidade.
Diferente de
projetos propostos antes dele, Saturnino de Brito queria a descarga dos esgotos
em locais afastados.
O plano previa
adoção de subdistritos, implantando uma série de estações elevatórias,
reduzindo os custos das obras, e uma rede de canais.
Estes canais
foram ladeados por avenidas, estruturando o desenho urbano de Santos, que hoje
é um dos mais expressivos referenciais, tornando o projeto uma das mais
completas contribuições ao planejamento urbano nacional.
Saturnino de
Brito descreveu sua obra em um livro intitulado Projetos e Relatórios, onde explicou as medidas tomadas e materiais
empregados.
Os canais são de
tipos diferentes, de acordo com a capacidade e condições dos locais
construídos.
A capacidade
tanto das galerias quanto dos canais foi avaliada para esgotar as águas desde
os pontos mais altos das montanhas até os bairros que seriam futuramente
formados na planície.
A técnica de
construção empregou o revestimento de concreto armado, em perfil transversal,
apropriado à execução econômica e sanitária da obra no terreno fluente.
O revestimento
de concreto armado, responsável por resolver o problema da cidade de modo estético,
sanitário e econômico; era formado por barras de ferro redondo.
O concreto se
regularizava a superfície interna por meio de um reboco de argamassa de um de
cimento e três de areia.
No fundo e nas
paredes laterais existiam drenos-filtros, que descarregam a água do subsolo e
diminuem as subpressões.
Estes drenos são
formados de tijolos perfurados, que saem de um fundo de areia grossa e
pedrinhas.
Foi necessário
muito cuidado para que não deixassem passar areia ao subsolo, pois isso
prejudicaria a obra.
Apesar destes
detalhes, ainda hoje não se sabe exatamente todo o processo de funcionamento
destes canais, pois carecem de informações originais.
Até mesmo a Sabesp,
empresa brasileira que detém a concessão dos serviços públicos de saneamento
básico no Estado de São Paulo, atualmente, está à procura das plantas.
O orçamento
inicial do projeto era de cerca de onze mil contos para construir os nove
canais, em valores atuais corresponderia a aproximadamente 135 milhões de reais.
Entretanto,
houve imprevistos e alterações que exigiram realocar os gastos para manter o
orçamento.
6.4. PANORAMA
ATUAL.
Atualmente, os nove
canais de Santos, do projeto original de Saturnino de Brito, possuem mais de cem
anos de idade e continuam sendo considerados um marco para a cidade.
Não são apenas
um monumento com função urbanística, permanecem em atividade funcional,
responsáveis por conduzir as águas pluviais ao mar.
Apesar de não
serem vistos como pontos turísticos, os canais servem como sistema de orientação
para quem vai ao centro, muito mais que aos bairros.
As estruturas
originais já foram reformadas, ainda antes da cidade receber novos canais,
todavia, nunca precisaram de reconstrução.
Mesmo assim,
continuam desprestigiadas, houvesse maior valorização deste patrimônio, os
canais poderiam se tornar um centro turístico e de aprendizagem, principalmente
com toda a história por trás de sua construção.
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Exposição da Maquete simbolizando um trecho de um dos canais de Santos, confeccionada pelos coautores do artigo; em evento interno na Unimonte. Fonte: Foto do autor. |
7. DISCUSSÃO.
Tendo em vista
todo o material estudado, desde a causa que levou ao projeto dos canais, o
porquê de terem sido construídos, a história por trás de sua inauguração, os
materiais, métodos e técnicas utilizadas para sanar os problemas urbanísticos e
de saneamento; nota-se a relevância do monumento e que foi um projeto bem
sucedido.
Mesmo com as
varias controvérsias políticas, sociais e econômicas; os canais contribuíram
para uma sociedade melhor, sendo o estopim para a urbanização de Santos.
Os quais ainda
hoje são bem utilizados e servem como ponto de referência por toda a cidade,
tanto para os moradores quanto aos visitantes; apesar de infelizmente não serem
mais utilizados para o transporte fluvial.
Os canais de
Santos, representados em forma de maquete, podem contribuir para futuros
estudos que aprofundem o tema, fomentando novas investigações.
A maquete
imortaliza na memória dos homens um dos principais monumentos históricos da
cidade.
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Exposição da Maquete simbolizando um trecho de um dos canais de Santos, confeccionada pelos coautores do artigo; em evento interno na Unimonte. Fonte: Foto do autor. |
8. CONCLUINDO.
Ao longo do
século XX, Santos foi aperfeiçoada com planos urbanísticos e de saneamento,
planejamentos aplicados na medida dos interesses políticos e econômicos da
época.
Apesar de todas
as controvérsias e dificuldades contra a sua implementação, os planos de
Saturnino de Brito para o saneamento de Santos obtiveram sucesso desde o primeiro
momento, satisfazendo as necessidades imediatas e futuras da população.
Os canais
colocaram fim nas epidemias provenientes das más condições sanitárias que
afetavam os moradores da cidade, contribuindo com o processo de urbanização do
município.
Ainda hoje os
canais continuam ativos, funcionando como drenagem das águas pluviais por toda
a cidade, o que, no entanto, não resolve os atuais problemas de inundação
advindos do crescimento urbano.
São pontos de
referência, o que evidência sua relevância na história do litoral paulista.
Os detalhes do
processo da obra, as plantas originais dos canais de Santos, feitas por
Saturnino de Brito, e as técnicas usadas na construção não foram ainda
totalmente desvendas, nem mesmo o memorial ao engenheiro possui estas valiosas
informações.
Todavia, a
confecção da maquete e sua incorporação ao acervo do Instituto Histórico e
Geográfico de Santos constitui um primeiro passo na preservação de sua memória.
9. PARA SABER MAIS SOBRE O ASSUNTO.
9.1. FONTES.
BRASIL. Comissão de Saneamento de Santos.
Inauguração dos Trabalhos de Saneamento de Santos. Livrete Exposição. São
Paulo: Typographia Brazil de Rothschild & CO, 1913.
BRITO, Francisco
Saturnino Rodrigues de. Álbum Canais de
Drenagem Superficial. São Paulo: Typographia Brazil de Rothschiild &
Cia, 1908.
MAIA, P. Plano Regional de Santos. Edição do
autor, 1950.
Pesquisa de
campo no Palácio Saturnino de Brito
na cidade de Santos (SP).
9.2.
BIBLIOGRAFIA.
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Forte abraço.
Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos.
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