Para entender a história... ISSN 2179-4111.
Ano 7, Volume dez., Série 15/12, 2016.
Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos.
Doutor em Ciências Humanas - USP.
MBA em Gestão de Pessoas - UNIA.
Licenciado em História - CEUCLAR.
Licenciado em Filosofia - FE/USP.
Bacharel em Filosofia - FFLCH/USP.
Dentre os fatores
que criaram condições favoráveis, para além de várias razões que levaram os
lusos a buscarem no mar a expansão da fé e o enriquecimento; a localização
geográfica esteve na gênese do pioneiro nas grandes navegações do século XV e
XVI.
Todavia, como
cantou Camões, foi graças a estar situado quase no cume da cabeça de Europa ,
onde a terra se acaba e o mar começa, que Portugal pôde lançar-se à aventura
ultramarina.
O território, na
antiguidade, era considerado, principalmente no período romano, uma região
periférica, situada nos limites do mundo conhecido, concepção herdada dos
gregos.
A Odisseia, de Homero, retratava o Estrito
de Gibraltar como a entrada do submundo, nomeado como um lugar para além das
Colunas de Hércules.
Nem por isto o
território era desprovido de valor, em suas terras podiam ser encontradas ricas
jazidas de ouro e prata e os melhores ourives de todo o mundo greco-romano.
Na História, Heródoto utilizou pela
primeira vez o nome Tartessos, narrando o caso de um mercador grego, Colaios de
Samos, que teria comercializado com o rei Argantonio.
Este nome
carregava um simbolismo de como a Península Ibérica era vista pelos gregos, pois
na versão arcaica deste idioma significa “o homem da montanha de prata”, sugerindo
a riqueza mineral.
Uma característica
que explica, posteriormente, a criação de núcleos populacionais romanos, no
atual Portugal, de grande importância no mundo antigo, tal como Conimbriga, a
17 Km a sul da atual Coimbra.
Uma cidade cujas
ruínas, em bom estado de conservação, foram em grande parte já escavadas, dando
provas da importância da colônia da Lusitânia, dentro da amplidão do Império Romano
desde pelo menos 83 a.C.
Portanto, desde
a antiguidade, localizado no extremo Ocidental da Europa, contido em suas
fronteiras Orientais pela Espanha, graças aos ventos e correntes que levam ao
mar aberto, Portugal esteve condicionado a buscar uma saída pelo Atlântico.
Possuía
ancoradouros naturais ao longo da costa e uma tradição de deslocamento por via
fluvial, o que estimulou a entrada das primitivas embarcações lusas cada vez mais
em direção ao alto mar.
O condicionante geográfico
conduziu ao aprimoramento da indústria naval, chamada na época de arte náutica.
Não obstante,
embora a posição geográfica explique a intimidade do povo com o mar, não
justifica de todo seu pioneirismo, questão mais complexa.
Uma vez que os
ingleses, tendo seu país situado em uma ilha, também poderiam ter se lançado ao
pioneirismo naval, dado sua posição no globo, até mesmo antes dos lusos.
No caso das
terras que iriam formar a Grã-Bretanha, uma série de questões internas retardou
até tardiamente a entrada dos ingleses na corrida do expansionismo colonial,
iniciado na Idade Moderna.
Já no caso
português, a tradição cultural, herdada da mistura eclética entre povos de
origens diversas, durante a proto-história do território Ibérico; somada a uma
série de circunstâncias políticas e militares; levou Portugal a ser deslocado
de zona periférica para território de passagem obrigatória, remetendo novamente
a geografia.
Sendo já ponto
de passagem obrigatório durante a antiguidade, no contexto das cruzadas, a
abertura de rotas comerciais de especiarias, via as cidades italianas, contribuiu
enormemente para o pioneirismo lusitano.
Novamente, a
geografia condicionou Portugal a servir de escala e entreposto comercial
italiano, intermediando produtos Orientais para o norte da Europa.
Em 1947, Jaime
Cortesão foi um dos primeiros historiadores a chamar a atenção para predestinação
geográfica e política de Portugal.
Braudel, em seu O Mediterrâneo e o mundo mediterrânico na
época de Felipe II, também alertou para os laços entre a história e o
espaço.
Não obstante,
poderia ser objetado que Portugal sempre esteve situado no mesmo lugar, o que
daria margem a perguntar por que então não se lançaram os lusos a aventura
marítima antes.
Para compreender
este aparente enigma, é necessário ter em mente que núcleos populacionais só se
formam onde recursos naturais propiciam a manutenção da vida, ao passo que no
território onde se estabeleceria Portugal não foi diferente.
Embora algumas
regiões do futuro Estado português não se mostrassem muito atrativas, devido à
baixa fertilidade do solo, o potencial hídrico e mineral constituiu, desde cedo,
um chamariz, ao mesmo tempo em que o mar e os rios foram sempre uma excelente
reserva alimentícia.
Assim, conforme
o volume populacional manteve-se estável, não houve necessidade de avançar mar
adentro em busca de recursos, inclusive se encarregando o próprio imaginário
popular de impedir qualquer ação neste sentido.
O crescimento da
densidade populacional nas cidades a partir do século XIV, aliado ao
esvaziamento do campo, obrigou os lusos a buscarem no mar os recursos que o
solo não podia suprir.
Justamente em um
momento em que outros fatores se somaram a este, valorizando a posição
estratégica de Portugal.
O que
impulsionou sua população para a aventura marítima, constituindo a solução mais
óbvia aos problemas que se impunham no período.
Deste modo, caso
a geografia de Portugal ou um dos fatores do contexto da época fosse diferente,
poderiam os lusos nunca ter adotado a solução Atlântica.
Provavelmente
teriam buscado outra resposta aos problemas enfrentados ou mesmo migrando para
outro local em busca de recursos, algo que não seria novo na história da
humanidade.
Uma possível
resposta à falta de braços no campo e a superlotação das cidades no século XV,
terminaria certamente tendo um desfecho natural, não fosse à posição de
Portugal no globo.
Não houvesse a
opção de ir buscar no mar a solução, a própria falta de alimentos teria se
encarregado de equilibrar a densidade populacional rural e urbana, fazendo os
elementos urbanos buscarem por si fugir das cidades.
No entanto, devemos
ter presente que a localização favorável de Portugal, em si, não foi à única
mola impulsionadora do pioneirismo naval.
Este pioneirismo
só fez cumprir-se devido a uma somatória de fatores.
Onde se insere o
ideal cruzadístico, que levaria os lusos a dar continuidade à guerra contra os
infiéis no norte da África, por sua vez, gerado pela guerra de reconquista.
O próprio
contato com os mouros, advindo da guerra de reconquista, traria inovações
técnicas vitais ao aperfeiçoamento de embarcações, este também um fator
entrelaçado com a geografia.
Aliás, somando-se
a este fator, a carência do solo e a indústria da pesca, foi igualmente uma
força impulsionadora ligada à localização geográfica.
A solução Atlântica,
aparentemente ideal aos problemas que se impunham, nasceu do condicionante geográfico;
a despeito deste estar entrelaçado com outros, os quais analisaremos em
separado em outros textos.
Para saber mais sobre o assunto.
RAMOS, Fábio
Pestana. No tempo das especiarias. São
Paulo: Contexto, 2006.
RAMOS, Fábio
Pestana. O apogeu e declínio do clico das
especiarias: 1500-1700. Volume 1: Em busca de cristãos e especiarias. Santo André: FPR/PEAH, 2012.
RAMOS, Fábio
Pestana. Por mares nunca dantes
navegados. São Paulo: Contexto, 2008.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Esteja a vontade para debater ideias e sugerir novos temas.
Forte abraço.
Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos.
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.